quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Educação Superior

Contra-reforma neoliberal ou democratização inadiável?*

Em abril de 2007, após um processo de debates e consultas à comunidade acadêmica, o Ministério da Educação instituiu por decreto o REUNI-Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais. A medida completa um ciclo de mudanças no ensino superior aberto pelo governo Lula, que se iniciou com programas como o PROUNI e o incentivo a políticas afirmativas de inclusão.


O REUNI tem como metas ampliar a oferta de vagas nas universidades federais, reduzir as taxas de evasão e reorganizar os cursos de graduação. Suas premissas estão expostas no documento Reestruturação e Expansão das Universidades Federais - Diretrizes Gerais, que identifica problemas como "uma concepção fragmentada do conhecimento, resultante de reformas universitárias parciais e limitadas nas décadas de 60 e 70″, que levou à incorporação de "currículos pouco flexíveis, com forte viés disciplinar, situação agravada pelo fosso existente entre a graduação e pós-graduação". Busca combater também a "excessiva precocidade na escolha da carreira profissional, além de tudo submetida a um sistema de seleção pontual e socialmente excludente".

O programa enfrenta forte oposição da ANDES, o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior. No documento PDE - O plano de desestruturação da educação superior, publicado em outubro de 2007, o sindicato acusa o MEC de desmontar "a universidade baseada na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão", de tentar ampliar o acesso à universidade sem a correspondente ampliação dos investimentos feitos pelo Estado e de pôr em risco a autonomia universitária, ao "pressionar dirigentes universitários a aderirem a suas regras com a promessa de aumento de verbas".

Os estudantes estão divididos em relação à reforma. Grupos de oposição à UNE encamparam as críticas da ANDES e lideraram no ano passado uma onda de ocupações de reitorias, que se íntensificou à medida em que as direções das universidades federais aderiam ao REUNI. Mas depararam-se com a resistência de parcela considerável do movimento estudantil organizado.

Dois artigos publicados pelo Le Monde Diplomatique explicitam o racha. Em Ocupar a Universidade, os estudantes Vinícius Almeida, Allan Mesentier e Daniel Nunes criticam vários aspectos pontuais da reforma proposta pelo MEC, como a insuficiência de verbas e a redução estimada no número de professores por alunos. Mas acima de tudo exigem autonomia e democratização dos fóruns de decisão das universidades. "Propostas como congressos internos, plebiscitos, paridade nas instâncias e transparência na administração das instituições têm o intuito de construir projetos para as universidades fora dos marcos do REUNI e de suas metas incabíveis", afirmam os estudantes.

"Mais do que um conjunto de medidas protagonizadas pelo governo Lula, a reforma universitária é uma bandeira histórica do movimento estudantil", retruca o estudante Bruno Cava, editor do revista Enxame, no artigo A democratização inadiável. Ele acusa o movimento anti-REUNI de defender uma universidade elitista e excludente, que reproduz a concentração de riqueza que caracteriza o Brasil.

"Acusam o REUNI de ser abstrato, de não passar de promessas numa folha de papel. Não é concreto um jovem na universidade, um jovem em carne-e-osso, com uma história, que vai estar na universidade e desenvolver-se socialmente por causa do REUNI? E uma multidão de jovens - 20%, 40% ou 100% a mais nos próximos anos, graças ao decreto? Nenhuma 'revolução' prometida pela oposição pode ser mais concreta do que isso. Barrar o REUNI não é simplesmente barrar um decreto: é barrar, na realidade, esses muitos jovens" - afirma Cava.


E você, o que pensa da reforma universitária empreendida pelo governo Lula?


*Extraído de Mercado Ético. Para acessar clique em Ético.

Um comentário:

Marcelo Henrique Marques de Souza disse...

Acho que essa ideia de defender que a universidade é elitista é altamente inocente, na medida em que a mesma se configura como ensino 'superior', portanto com claro simbolismo ligado a uma ascensão qualitativa.

Ademais, não acho que a estruturação tradicional dos cursos seja ruim, muito pelo contrário. As matérias teóricas por exemplo, são fundamentais, por conta de que exercitam a reflexão e o contato com os sistemas de pensamento nos futuros profissionais. Esse papo contemporâneo de que "há muita teoria e pouca prática" é outra inocência, de quem não sabe exatamente qual é o papel da universidade na vida social. Para além do caráter ideológico da educação, já apontado por vários, como Althusser, vale lembrar que a educação superior, em sua configuração tradicional, serve para preparar o futuro profissional, tanto técnica quanto, inclusive, eticamente. Esta segunda função fica extremamente comprometida quando se ataca a parte teórica em prol de um pragmatismo que não gera reflexão.

Além disso, a tendência apontada pela tal "Revolução", de colocar a formação dos currículos nas mãos dos alunos, é triplamente equivocada: primeiro, fragmenta a prática profissional, o que vai acarretar, certamente, em problemas estruturais relacionados às pessoas que vão receber os serviços dos formados. Segundo, por que centra o saber nas mãos do aluno, como parte da mitologia pedagógica atual (o que, inclusive, denuncia o caráter não-revolucionário da coisa, na medida em que o ego é a referência discursiva atual, claramente). E terceiro, por que elimina a simbologia externa da lógica universitária, o que acabaria por desconstruir os aspectos de coletividade ligados ao papel do profissional formado.

Estamos caminhando para a desconstrução completa das instituições, adotando mudanças com capa de "vanguarda" quando, na verdade, são é embustes retóricos com simbologia claramente antisocial. Em outras palavras, aluno que imagina ser o centro da profissão não cria vínculo (sobre as teorias do vínculo, a psicanálise está farta delas). Vínculo se cria com identificação externa ao ego. E não tratando os alunos como consumidores, que "têm sempre razão"...

Abraços e parabéns pelo blog