quinta-feira, 24 de março de 2011

Sustentabilidade


Hidrelétrica de Belo Monte: caminho necessário?

Daniel Roedel

Belo Monte é um projeto de usina hidrelétrica a ser construída no Rio Xingu-PA. Com custo estimado em R$ 19 bilhões a iniciativa tem despertado fortes apoios e também resistências na sociedade.

Embora os debates estejam bastante acirrados muitas vezes as análises feitas pelas partes nos levam a concordar com os argumentos de ambos. Afinal, o país necessita de energia para para manter o crescimento e o potencial hidrelétrico que possuímos não pode ser desprezado.

No entanto, o modo de obter e se sustentar o crescimento não pode somente se orientar pela perspectiva econômica, uma vez que crescimento não é sinônimo de desenvolvimento. E o desenvolvimento inclui a melhoria da qualidade de vida da sociedade em geral e a apropriação pela população dos seus benefícios, dentre outros aspectos. Isso significa que o PIB não é um indicador suficiente para medir o desenvolvimento de um país. Indicadores como o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH têm sido recomendados pela possibilidade de visualização da apropriação coletiva dos resultados alcançados pelas políticas de desenvolvimento dos países.

No caso da construção da hidrelétrica de Belo Monte a mídia tem destacado a polêmica entre a necessidade essencial da energia a ser gerada, defendida pelo governo federal, e os impactos socioambientais que, segundo ambientalistas foram subestimados.

O tema continua em discussão, talvez até de modo mais enfático dos dois lados devido à mais recente crise nuclear com a usina de Fukushima no Japão. Pode ocorrer um fortalecimento da opção hidrelétrica como alternativa à energia nuclear por um lado, ou a intensificação dos protestos contrários a Belo Monte devido aos problemas socioambientais exemplificados também pela experiência nuclear.

Convidamos você a manifestar a sua opinião na enquete sobre a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte em nosso blog e fazer  o seu comentário neste espaço!

Sustentabilidade

Resultado de nossa enquete: como o governo do Rio de Janeiro deve conduzir a busca de uma solução para os problemas causados pela CSA na região de Santa Cruz?
  • Deve contemporizar e negociar exaustivamente, pois trata-se de importante investimento privado para o estado e que contou com recursos públicos - 19%.
  • Deve aplicar pesadas multas e direcionar esses valores para equacionar os problemas socioambientais gerados pela siderúrgica - 23%.
  • Deve exigir a imediata suspenção das atividades da siderúrgica até que os graves problemas socioambientais sejam resolvidos - 13%.
  • Deve multar e suspender as atividades da siderúrgica até que os problemas socioambientais sejam resolvidos - 45%.

Nossa opinião


Primeiramente temos que reconhecer que recursos públicos devem ser geridos de modo público! Ou seja, com transparência e com ênfase em causas que tenham repercussão positiva para o conjunto da sociedade. E os aspectos socioambientais são cada vez mais entendidos como preocupação relevante para a população. O resultado da nossa enquete, na qual 81% entendem que a siderúrgica deve ser penalizada pelos problemas causados, reforça essa preocupação com os aspectos socioambientais da atividade empresarial e da gestão pública. Desse modo, apoiar a conquista de investimentos privados pode ser uma boa iniciativa, desde que preserve tais princípios (que não esgotam o tema).

Em nossas consultas a sites dos governos estadual e municipal não identificamos a existência de critérios socioambientais como contrapartida ao apoio público ao investimento privado, nem um monitoramento permanente do cumprimento de possíveis exigências desse tipo. Se existem (e devem existir), estão restritos a instâncias da burocracia governamental e a sociedade não está participando desse processo, embora sofra com os desdobramentos negativos do não cumprimento de requisitos socioambientais por parte da TKCSA. Também os sites da empresa não informam suas práticas preventivas e corretivas.

Durante a realização da nossa enquete acompanhamos e divulgamos neste blog diversas notícias acerca dos problemas socioambientais da implantação do projeto da TKCSA em Santa Cruz. Embora tenhamos monitorado também a grande imprensa nacional, não identificamos notícias positivas em relação às práticas socioambientais da siderúrgica.

A questão é bastante delicada, principalmente porque esses problemas apresentados pela TKCSA podem se potencializar uma vez que estão previstos elevados investimentos na mesma região. Excluir a sociedade das discussões acerca do direcionamento de recursos públicos com fins privados não é uma prática adequada para uma democracia que tenta se consolidar. Reiteramos que esses investimentos privados, associados ao apoio público, são relevantes e necessários numa democracia capitalista que almeja se desenvolver de modo sustentável, o que significa muito mais do que apenas crescer na perspectiva econômica.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Internet e movimentos sociais


O poder da internet: fatos x versões*


Venício Lima**

Os últimos acontecimentos políticos no norte da África constituem ocasião singular para observação do papel da mídia no mundo contemporâneo. Da nova e da velha mídia.

Embora seja mais fácil e simpático estabelecer, sem mais, uma relação de causalidade direta entre as novas TICs e a derrubada, por exemplo, do velho ditador egípcio, talvez seja prudente não precipitar conclusões.

A palavra do especialista

Quando esteve no Brasil, a convite do Centro Ruth Cardoso, aquele que muitos consideram a maior autoridade mundial da chamada “sociedade-rede”, Manuel Castells, em entrevista à Folha de São Paulo conduzida dentro do controvertido enquadramento de “decepção com o papel da internet no processo eleitoral brasileiro”, declarou às vésperas do primeiro turno das eleições de 2010:

“O Brasil segue uma dinâmica assistencialista em que da política se esperam subsídios e favores, mais do que políticas. A situação econômica do país melhorou consideravelmente. (...) A renovação do sistema político exige que as pessoas queiram uma mudança, e isso normalmente ocorre quando existem crises. A internet serve para amplificar e articular os movimentos autônomos da sociedade. Ora, se essa sociedade não quer mudar, a internet servirá para que não mude” [grifo meu; cf. http://www1.folha.uol.com.br/poder/801906-se-um-pais-nao-quer-mudar-nao-e-a-internet-que-ira-muda-lo-diz-sociologo-espanhol.shtml].

Recentemente, diante das manifestações populares na Tunísia e no Egypto, perguntado se estava surpreso pela mobilização social, Castells respondeu:
“Na verdade não. No meu livro ‘Comunicação e Poder’, dediquei muitas paginas para explicar, a partir de uma base empírica, como a transformação das tecnologias de comunicação cria novas possibilidades para a auto-organização e a auto-mobilização da sociedade, superando as barreiras da censura e repressão impostas pelo Estado. Claro que não depende apenas da tecnologia. A internet é uma condição necessária, mas não suficiente. As raízes da rebelião estão na exploração, opressão e humilhação. Entretanto, a possibilidade de rebelar-se sem ser esmagado de imediato dependeu da densidade e rapidez da mobilização e isto relaciona se com a capacidade criada pelas tecnologias do que chamei de “auto-comunicação de massas” [grifo meu; cf. http://www.outraspalavras.net/2011/03/01/castells-sobre-internet-e-insurreicao-e-so-o-comeco/ ]

Embora se referindo a situações radicalmente distintas, Castells indica que as TICs – redes sociais, celulares e outros – não causam os movimentos sociais mas funcionam como “condição necessária” para a ampliação e articulação deles. E, por óbvio, é necessário que as TICs estejam suficientemente (?) difundidas na sociedade em questão, seja ela o Brasil ou a Tunísia.

A velha mídia

Por outro lado, comentando depoimento da Secretaria de Estado Hillary Clinton no Comitê de Política Externa do Senado dos Estados Unidos, no dia 2 de março, no qual ela afirmou que os EUA estavam perdendo a “guerra da informação” (sic) para a rede Al Jazeera, o jornalista político escocês-estadunidense Alexander Cockburn, um dos editores do jornal CounterPunch, lembrou:
“(...) há uma florescente pequena indústria da internet que afirma que a derrubada de Mubarak ocorreu por cortesia do comando Twitter-Facebook dos EUA. O New York Times publicou numerosos artigos sobre o papel do Twitter e do Facebook enquanto ignora ou vilipendia ao mesmo tempo Julian Assange e Wikileaks. Por certo, em qualquer discussão sobre o papel da internet na convocação dos levantes no Oriente Médio, deveria se dar o maior crédito ao Wikileaks. Mas Wikileaks, junto com Twitter e Facebook, tornam-se quase insignificantes em comparação com o papel exercido pela Al Jazeera. Milhões de árabes não podem tuitar e não estão familiarizados com o Facebook. Mas a maioria vê televisão, o que significa que todos assistem à Al Jazeera, a qual detonou o “artefato explosivo improvisado” que estourou sob a Autoridade Palestina, a saber, o conjunto de documentos conhecidos como Palestine Papers” [cf. http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17511 ]

Para Hillary e para Cockburn a “guerra da informação” continua sendo travada e disputada, de fato, no território da velha televisão.

Ainda Gramsci

Todas essas considerações são apenas para repetir a cautela que tenho reiterado em relação às interpretações que atribuem, sem mais, poderes mágicos e revolucionários às novas TICs.

Nos “Cadernos de Cárcere” quando Antonio Gramsci (1891-1937) comenta sobre a "crise de autoridade" (Selections of the Prison Notebooks; International Publishers, New York, 1971; págs. 275-276), embora, por óbvio, as circunstâncias fossem outras e seja necessária uma pequena adaptação no texto, penso que se aplica ao nosso momento histórico a idéia de que "o velho está morrendo e o novo apenas acaba de nascer. Nesse interregno, uma grande variedade de sintomas mórbidos aparece" (a frase original correta é: "A crise consiste precisamente no fato de que o velho está morrendo e o novo ainda não pode nascer. Nesse interregno, uma grande variedade de sintomas mórbidos aparece").

Um pouco de cautela talvez não nos leve a conclusões precipitadas sobre o real poder das novas TICs. E, mais importante, evite erros graves na avaliação e na formulação de políticas públicas para as comunicações.

*Extraído de Carta Maior. Para acesso clique em Carta.

**Professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Sustentabilidade

Missão constata graves problemas socioambientais em Santa Cruz*

PACS

Em decorrência do agravamento da poluição industrial provocada pelo início da operação da ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA) em Santa Cruz (em junho de 2010), foi realizada em 17/09/2010 uma missão constituída por técnicos, pesquisadores, acadêmicos, parlamentares, personalidades atuantes nas áreas de direitos humanos,meio ambiente e saúde com o objetivo de prestar solidariedade às comunidades da região e coletar informações, depoimentos e investigar denúncias relacionadas à violação de direitos humanos e crimes socioambientais cometidos pela usina, que é projeto da ThyssenKrupp e da Companhia Vale do Rio Doce.

A missão visitou, pela manhã, a Escola Municipal Sindicalista Chico Mendes, a UPA João XIII, o Posto de Saúde Prof. Ernani Paiva Ferreira Braga e o Posto de Saúde da Família Dr. Cattapreta. Nestas conversas puderam-se perceber alguns indícios de aumento de problemas de saúde, bem como da extensão da poluição. Dados mais objetivos relacionados à saúde e ao meio ambiente serão coletados mais a frente, no decorrer da investigação que será levada a cabo pelas instituições integrantes da missão. Verificou-se, portanto, a necessidade de rever os protocolos médicos, c o m a reformulação dos boletins de atendimento, de forma a sistematizar e padronizar os dados epidemiológicos referentes aos problemas respiratórios , oftalmológicos e dermatológicos, que pudessem orientar as ações de vigilância em saúde e de reversão urgente do cenário atual.

A deputada alemã do Parlamento Europeu, Gabriele Zimmer, integrante da missão, foi recebida pela TKCSA para uma reunião na qual cobrou explicações da empresa sobre as denúncias existentes. Vale destacar que a empresa proibiu a entrada de diversos especialistas que vêm acompanhando sistematicamente os arbítrios e desrespeitos promovidos pela empresa, bem como dos veículos de comunicação.

*Extraído do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul. Para acesso clique em PACS.

Sustentabilidade


O trágico preço do “progresso”*

Tatiana Merlino

De repente, numa madrugada de junho de 2010, uma chuva de prata caiu sobre a casa de dona Ivonete Martins. Tudo brilhava, como num sonho. Porém, quando a família acordou para ir trabalhar, deparou-se com a realidade: um pó prateado havia se espalhado por toda a casa. Telhado, sala, banheiro, cozinha. Até nas panelas ele estava. O pó foi parar no quarto de dona Ivonete, de 55 anos. Quando ia dormir, lá estava ele, brilhando. Dias depois, quando foi tomar banho, a mulher percebeu que até em seu corpo o pó estava grudado. Em seguida, começaram as coceiras. Parecia picada de mosquito. A cada dia, a coceira só aumentava, e foi se estendendo ao corpo todo. Depois de um tempo, até a palma das mãos e sola dos pés estavam tomados por alergias, que se transformaram em cascas. “Eu estava toda inchada”. Para combater a coceira, ela tentou de tudo. “Querosene, álcool, vinagre”. O desespero era tanto que ela pensou até em se matar. Para completar, dona Ivonete foi demitida do emprego, pois a senhora para quem trabalhava como empregada doméstica teve medo de ser contaminada com suas alergias. Em casa, disse ao marido: “Arrume outra mulher. Essa aqui não presta mais”.

A chuva de prata não banhou apenas a casa e o corpo de dona Ivonete. Seus vizinhos, moradores do bairro de Santa Cruz, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro, também foram atingidos com o pó metálico emitido pelo complexo siderúrgico ThyssenKrupp Companhia Siderúrgica do Atlântico (TKCSA). De capital majoritariamente alemão, ligada ao grupo transnacional Tyssen Krupp (73,13%), com participação da Vale do Rio Doce (26,87%), a CSA foi anunciada como a siderúrgica mais moderna do mundo - recebeu investimentos de 5,2 bilhões de euros e vai produzir cinco milhões de toneladas por ano de placas de aço, exportadas para a Alemanha e Estados Unidos. É o maior investimento privado realizado no Brasil nos últimos 15 anos.

* Extraído de Caros Amigos. Para acesso clique em TKCSA.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Sustentabilidade

A CSA e os desdobramentos socioambientais II

Daniel Roedel

No dia 25 de fevereiro moradores da região de Santa Cruz estiveram com a Superintendente de Rrelações Institucionais da Secretaria Estadual do Ambiente - SEA protestando contra os problemas socioambientais causados pela operação da CSA.

Embora a SEA tenha reiterado que não concederá a licença definitiva para a operação da siderúrgica até que sejam cumpridas as exigências ambientais, o fato é que a operação teve início e vem causando esses graves problemas socioambientais. E isso leva a alguns questionamentos. Quais foram os critérios adotados para a autorização do início das atividades? Os problemas surgidos foram de fato imprevistos? Como o governo acompanhou o cumprimentos das exigências iniciais de operação?

Vale lembrar que o próprio governador do estado declarou no ano passado que a siderúrgica não causava
problemas ambientais. Em seguida multas foram aplicadas. E no dia 25 de fevereiro a empresa emitiu comunicado alertando que já utiliza tecnologias ambientais avançadas e se comprometendo a negociar com o Inea a superação dos problemas causados na região.

Esses questionamentos visam fundamentalmente tentar entender o conjunto de critérios adotados para autorizações de empreendimentos cuja natureza pode gerar impactos sociais e ambientais. É previsível que o forte apelo econômico do empreendimento e a geração de empregos diretos e indiretos a ele associados estimulem uma perspectiva otimista. Mas e as consequências que não cansam de aparecer? Será que servirão de exemplo no momento de se avaliar outras isenções fiscais e autorizações? O alerta é urgente, porque hoje o grupo Gerdau anunciou investimentos da ordem de R$ 2,4 bilhões na expansão da
Cosigua, localizada no bairro de Santa Cruz...

Aqueles que entendem a sustentabilidade como requisito fundamental para a gestão pública, privada e no denominado terceiro setor devem acompanhar se esses critérios estão sendo efetivamente aplicados de modo equilibrado. Do contrário, a questão socioambiental continuará coadjuvante dos aspectos econômicos e problemas como os da CSA não serão propulsores para uma nova conduta dessas decisões.

Internet e movimentos sociais


Castells, sobre Internet e Rebelião: "É só o começo"*


Jordi Rovira**

Os meios de comunicação passaram semanas centrando sua atenção na Tunísia no Egito. As insurreições populares que se desenvolveram após o sacrifício do jovem tunisiano Mohamed Bouazizi, terminaram em poucos dias com a ditadura de Bem Ali e na sequência, como peças enfileiradas de dominó, com a “presidência” de Hosni Mubarack. Abriram-se processos democráticos em ambos os países. Manifestantes também saem às ruas árabes na Líbia, Iêmen, Argélia, Jordânia, Bahrain e Omã.

Em todos esse processos, as novas tecnologias jogam um papel chave primordial - em especial, as redes sociais, que permitem superar a censura. Ante esse desfecho histórico, Manuel Castells, catedrático sociólogo e diretor do Instituto Interdisciplinar sobre Internet, na Universitat Oberta de Catalunya, aprofunda a reflexão sob o que se passa e oferece chaves para entender um movimento cidadão que tira o máximo proveito dos novos canais de comunicação ao seu alcance.

Os movimentos sociais espontâneos na Tunísia e Egito pegaram desprevenidos os analistas políticos. Como sociólogo e estudioso da Comunicação, você foi surpreendido pela ação da sociedade-rede destes países, em sua mobilização?

Na verdade não. No meu livro Comunicação e Poder, dediquei muitas paginas para explicar, a partir de uma base empírica, como a transformação das tecnologias de comunicação cria novas possibilidades para a auto-organização e a auto-mobilização da sociedade, superando as barreiras da censura e repressão impostas pelo Estado. Claro que não depende apenas da tecnologia. A internet é uma condição necessária, mas não suficiente. As raízes da rebelião estão na exploração, opressão e humilhação. Entretanto, a possibilidade de rebelar-se sem ser esmagado de imediato dependeu da densidade e rapidez da mobilização e isto relaciona se com a capacidade criada pelas tecnologias do que chamei de "auto-comunicação de massas".

Poderíamos considerar estas insurreições populares um novo ponto de inflexão na história e evolução da internet? Ou teríamos que analisá-las como conseqüência lógica, ainda de grande envergadura, da implantação da rede no mundo?

As insurreições populares no mundo árabe são um ponto de inflexão na história social e política da humanidade. E talvez a mais importante das muitas transformações que a Internet induziu e facilitou, em todos os âmbitos da vida, sociedade, economia e cultura. Estamos apenas começando, porque o movimento se acelera, embora a Internet seja uma tecnologia antiga, implantada pela primeira vez em 1969.

A juventude egípcia desempenhou um papel chave nas insurreições populares, graças ao uso das novas tecnologias. No entanto, segundo os cálculos de Issandr El Amrani, analista político independente no Cairo, apenas uma pequena parte da população egípcia dispõem de acesso a internet. Pensa que esta situação pode criar uma brecha - usando suas próprias palavras, entre "conectados" e "desconectados" - ainda maior que a que se da nos países desenvolvidos?

O dado já esta antiquado. De acordo com uma pesquisa recente (2010), da empresa informação Ovum, cerca de 40% dos egípcios maiores de 16 anos estão conectados à Internet - se levarmos em conta não apenas as ligações domiciliares, mas também os cibercafés e os centros de estudo. Entre os jovens urbanos, as taxas chegam a 70%. Além disso, segundo dados recentes, 80% da população adulta urbana esta conectada por celulares. E de qualquer maneira, estamos falando de um país com 80 milhões de habitantes. Ainda que apenas um quarto deles estivessem conectados, já poderia haver milhões de pessoas nas ruas. Nem todo o Egito se manifestou, mas um número de cidadãos suficiente para que se sentissem unidos, e pudessem derrotar o ditador. A história da brecha digital em termos de acesso é velha, falsa hoje em dia e rabugenta. Parte de uma predisposição ideológica de certos intelectuais interessados em minimizar a importância da Internet. Há 2 bilhões de internautas no planeta, bilhões de usuários de celulares. Os pobres também têm telefones móveis e existem ainda outras formas de acessar a Internet. A verdadeira diferença se dá na banda e na qualidade de conexão, não no acesso em si, que está se difundindo com rapidez maior que qualquer outra tecnologia na história.

...

*Extraído de Diplô. Para acesso completo clique em Castells
**Universitad Oberta de Catalunya. Tradução: Cauê Seigne Ameni