quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Empreendedorismo

Considerações sobre Empreendedorismo – parte II

Daniel Roedel*

Esse processo empreendedor foi definido por Joseph Schumpeter, na primeira metade do século XX, como de “destruição criativa”, característica essencial do capitalismo para a criação permanente de valor e inovação, que substitui e destrói antigas práticas e processos de produção. Schumpeter o considerou condição essencial para o crescimento econômico. Logo, a retomada do discurso empreendedor nos anos 1980 favoreceu o seu protagonismo em substituição a políticas desenvolvimentistas orientadas pelo Estado.

Desde então, a cultura do self made man assumiu a responsabilidade por promover o crescimento econômico e se tornou central na gestão de iniciativas privadas, públicas e, mais recentemente, do Terceiro Setor. Iniciativa e determinação individuais são valorizadas como elementos centrais na conquista dos bens e riquezas dos países, deslocando o Estado para um papel periférico de criação das condições de mercado para o desenvolvimento do empreendedorismo. A esse respeito vale consultar a obra de Ana Paula Paes de Paula cuja resenha foi recentemente publicada neste blog. Outra publicação relevante é O Neoliberalismo – história e implicações, de David Harvey (Ed Loyola, 2005).

No Brasil, diversas são as iniciativas visando tornar o empreendedorismo um modo eficaz de gestão e foco de atenção por parte dos poderes públicos. O Sebrae, o Endeavor e o Bota Pra Fazer são alguns exemplos de organizações que divulgam a causa empreendedora e orientam quanto à adoção de sua prática. Entre os aspectos positivos para ser empreendedor são destacados o dinamismo, a forte condição para a geração de empregos por parte de micro e pequenos negócios (o que interessa diretamente aos governos), a auto-realização e a superação de desafios (que estimula indivíduos a se tornarem empreendedores). Como exemplo de que ser empreendedor é o caminho para o êxito, diversos empresários que alcançaram sucesso são citados, principalmente aqueles que fizeram escolhas radicalmente diferente de suas vocações ou profissões iniciais.

Ainda visando enfatizar a importância do empreendedorismo, são freqüentemente apresentados dados das pesquisas do Global Entrepreneurship Monitor GEM. A edição de 2007 aponta que o Brasil ocupa a 9ª posição no ranking dos países empreendedores. Já o Sebrae destaca que as micro e pequenas empresas respondem por cerca de 25% do PIB do país.

No âmbito do serviço público o processo de modernização da gestão, praticado pelos governos desde os anos 1990, introduziu o viés empreendedor, estimulando sua prática em órgãos, empresas e servidores, até mesmo por meio de premiações para iniciativas consideradas exitosas. O Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – Gespública, criado pelo Decreto nº. 5.378 de 23 de fevereiro de 2005, é um exemplo recente do forte apelo que o tema do empreendedorismo exerce nos governos, mesmo aqueles que tentam se apresentar como restauradores da gestão pública e da relevância do papel do Estado no cotidiano da economia e da construção do futuro do país. É a cultura empreendedora sendo entendida como panacéia para a superação dos obstáculos e adversidades!
*Diretor da Plurimus

Cidadania

Quem banca a destruição da Amazônia?*

Karina Miotto

A mesa redonda “Amazônia e Sustentabilidade”, durante o Encontro Latino-Americano de Comunicação e Sustentabilidade, foi marcada por fortes opiniões de seus participantes, frases de efeito e informações que devem levar muita gente a se questionar sobre hábitos pessoais de consumo – o principal financiador da destruição da floresta.

Participaram da mesa João Meirelles, diretor do Instituto Peabiru e autor do “Livro de Ouro da Amazônia”, da editora Ediouro; Caio Magri, assessor de políticas públicas do Instituto Ethos e um dos principais articuladores do Fórum Amazônia Sustentável e Nelson Cabral, gerente setorial de segurança, meio ambiente e saúde da Petrobras. O jornalista Adalberto Marcondes, presidente do Instituto Envolverde, foi o moderador.

Se João Meirelles bateu na tecla dos prejuízos à pecuária, Caio Magri explicou a importância do Fórum Amazônia Sustentável e Nelson Cabral falou sobre ações sócio-ambientais da Petrobras, o que os três discursos tiveram em comum foi a abordagem da responsabilidade de cada cidadão, como consumidor, na destruição da maior floresta tropical do planeta.

João Meirelles vem de uma família com dez gerações de pecuaristas. É um profundo conhecedor do assunto e, como ele mesmo diz, hoje está bem é “do outro lado da cerca”. Ele afirmou que 75 milhões de hectares de floresta já sucumbiram sob as patas bovinas. “A culpa não é do boi, é do pecuarista”, faz questão de frisar. Se na Europa a média é de 3,5 cabeças de gado por hectare, na Amazônia é 0,5 – uma proporção completamente descabida.

De acordo com os participantes, a pecuária bovina gera diversos problemas, entre eles trabalho escravo, uso de enormes quantidades de água, queimadas e desmatamento. É o principal vetor de destruição da Amazônia, seguido pela indústria da soja e a extração ilegal de madeira.

Aproximadamente 20% do território da floresta já foi destruído e pesquisas apontam que se o ritmo continuar nesta velocidade, em menos de 30 anos não haverá mais Amazônia e a geração atual terá sido a última a conhecer a floresta como ela ainda é.

Hábitos de consumo

Meirelles e Caio afirmam que o maior mercado consumidor de carne bovina da Amazônia é o próprio Brasil, sendo que grande parte deste montante vai parar no prato de moradores do estado de São Paulo.

Se o consumo cresce, o desmatamento também cresce. É preciso quebrar este ciclo. Por isso, a conscientização e a adoção de hábitos de consumo mais conscientes é fundamental. “O consumidor não pergunta de onde vem a carne, os produtores não sabem responder e ninguém sabe nada. Precisamos nos posicionar e perguntar ao supermercado de onde vêm nossos produtos”.

Caio lembrou que, durante o seminário Conexões Sustentáveis: São Paulo – Amazônia, as três maiores redes de supermercado do país, compostas por Wal-Mart, Carrefour e Grupo Pão de Açúcar, aceitaram ser pressionados pelos consumidores, pois trabalhariam para evitar a compra de produtos de origem ilegal da Amazônia. “A sustentabilidade é a última possibilidade de vida do homem neste planeta. Estamos falando de perpetuação da espécie humana. Ou dormimos o sono eterno ou começamos a pensar em como enfrentar estas questões construindo opções sustentáveis”.

Nelson complementa afirmando que ter conhecimento é fundamental. “Precisamos ensinar bem e disseminar, pois o que aprendemos deve ser compartilhado por todos. Precisamos agir”. É preciso se posicionar e fazer alguma coisa. Não daqui dez anos, como lembra Caio, mas já. “A cada três mordidas no seu bifinho, uma vem da Amazônia. Estamos entregando a floresta nas mãos dos maiores bandidos deste país porque ainda tem gente que come carne que vem de lá. Não adianta dizer ´Ah como eu amo a Amazônia!´, mas continuar comendo churrasco”, afirma João.

Como diz Marina Silva, precisamos aprender com nossos erros. A Mata Atlântica foi destruída pela pecuária e dela hoje restam apenas 7%. Permitiremos que o mesmo aconteça com a Amazônia?

*Extraído de Mercado Ético. Para acesso à matéria completa clique em Amazônia.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Empreendedorismo

Considerações sobre Empreendedorismo – parte I

Daniel Roedel*

O empreendedorismo tem assumido, nas décadas mais recentes, uma vitalidade como alternativa fundamental para o sucesso competitivo e a excelência na gestão. E essa presença é tão marcante que já não se limita à iniciativa privada. Hoje o empreendedorismo se tornou receita para o sucesso em empresas e órgãos públicos e iniciativas sociais, com a figura do empreendedor social (ler artigo neste blog). É comum também que grandes empresas já consolidadas no mercado estimulem o empreendedorismo interno por parte de seus empregados.

De uma abordagem inicialmente centrada nas características de personalidade e estilos adotados por empreendedores de sucesso, seu entendimento migrou para a compreensão das condições que favorecem sua existência e desenvolvimento e como esse processo de empreender se dá na prática.

De um modo geral, a inovação, a capacidade de assumir riscos, de agir de modo proativo e de superar obstáculos visando à identificação e ao aproveitamento de novas oportunidades ou a melhoria de processos e produtos existentes, são entendidas como posturas empreendedoras.

Mas por que o tema ganhou essa dimensão? Que aspectos favoreceram a onda, até mesmo salvacionista do empreendedorismo? Para alcançarmos um entendimento inicial sobre o tema é importante buscarmos alguns elementos num passado recente, e sem a pretensão de esgotar o assunto. Retornemos ao início dos anos 1980. A retomada da onda liberal por parte dos governos de Margarete Tatcher na Inglaterra e de Ronald Reagan nos Estados Unidos consolidou a vitória do liberalismo econômico sobre o Estado do bem-estar social, que marcou o período 1930-1970.

Como conseqüência imediata, ocorreu uma forte diminuição da presença do Estado nas economias dos países, uma gradativa redução de barreiras ao comércio internacional, o fortalecimento de um ambiente concorrencial em escala global e a aceleração da inovação tecnológica visando ao aumento da eficiência e competitividade, entre outros fatores.

Essa diminuição da presença do Estado na economia e na vida das pessoas foi acompanhada de profundas alterações na legislação dos países, principalmente com relação a aspectos sociais, trabalhistas e de eliminação de reservas nacionais de mercado. As empresas privadas se reestruturaram para diminuir custos, principalmente custos fixos, e a busca de uma “gestão de excelência” para o “novo” ambiente competitivo dominou a agenda de empresas, universidades e consultores.

A forte repercussão na sociedade impactou as empresas e órgãos públicos que rapidamente incorporaram o “novo” modo de administrar. E o empreendedorismo é um dos ingredientes dessa novidade.

*Diretor da Plurimus

Cultura

A Lei Rouanet e o pau que nasce torto

Carlos Henrique Machado Freitas

Dizer que a concentração dos recursos da Lei Rouanet está no eixo Rio/São Paulo é uma injustiça, mais injusto seria afirmarmos que está nas duas capitais. Os recursos destinados à cultura via Lei Rouanet se restringem a uma parcela mínima da sociedade, ou seja, à geografia social e/ou territorial, logicamente nos metros quadrados mais caros do país e sempre nessas duas capitais. A periferia, os suburbios e as favelas, quando muito, se beneficiam de forma pontual, mas a integração da arte não, quando ela chega a essas regiões, seu foco deixa de ser artístico e passa a ser “social”.

No encontro “Diálogo Cultural” com o Ministro Juca Ferreira no Capanema, Rio de Janeiro, alguém do auditório reclamou que, no caso do Rio, os recursos da Lei estão nas mãos de apenas quatro produtoras.

Na verdade, o que temos é o domínio, como disse Machado de Assis, “o burlesco e caricato sobre o real e o criativo”. Podemos avançar em alguns pontos nas questões técnicas, mas não passará de algo tímido diante da nossa realidade que é a valorização da cultura através da técnica do aprendizado formal em detrimento ao que costumam classificar como empirismo primitivo.

Poderíamos cobrar os desdobramentos dessas duas visões, mas de quem - se as cúpulas oficiais da cultura brasileira sempre caminharam sob a cultura formatada, idealizada no sentido de estender a imposição de matrizes européias no Brasil? Como cobrar dessa cúpula um sentido amplo da cultura brasileira se, na maioria dos casos, ela sequer sabe de si? É um quadro desalentador, como pude comprovar no “Diálogo Cultural”, onde, num coro uníssono, parte da platéia gritava pela manutenção dos seculares privilégios. Estavam lá, na quase totalidade, representantes dessa minúscula e privilegiada sociedade exigindo os mesmos privilégios da nobreza artística que julgam ter, os mesmos representantes de um pensamento pequeno que, durante os seis anos do governo Lula, se uniram à grande mídia e à grandes corporações em motins visando benefícios próprios em nome da cultura nacional. Os resultados estão aí pra quem quiser ver. O conceito sob o nome que está hoje em moda no Brasil, “diversidade cultural”, trouxe a quem sempre teve a poderosa máquina do mercado e sua extensa exposição, benefícios de um Estado paternalista a serviço das classes dominantes que, fortalecidas pela idéia de superioridade sócio/cultural proveniente das academias oficiais, amplia ainda mais as tensões sociais de uma sociedade que transborda conflitos, fruto de anos e anos de concentração de renda. É uma questão complexa. As cúpulas sequer têm independência, seus conceitos obedecem cegamente a uma cartilha de formas e costumes importados, um ideário branco que ganhou tônus nesses últimos anos.

O que vemos é muita gente se fartando do dinheiro público e com o mesmo discurso dos oráculos dos imantados de sempre na busca pela salvação dos homens de “menos cultura”. Até quando vai durar no Brasil essa idéia dos auto-proclamados deuses da cultura?

Extraído de Cultura e Mercado. Para acesso à página clique em Rouanet.

Nossa opinião

É inspiradora a idéia de que uma discussão aberta e séria tome lugar no discurso dos "fazedores de cultura" do país. Mas é preciso, sobretudo, não cair na tentação de, a partir de uma perspectiva que se pretende garantidora da amplitude da diversidade cultural brasileira, exclua segmentos rotulados como de elite/não populares - porque distantes da massa (e quanto à resistência à cultura de massa?). É fato que a Lei Rouanet não está funcionando bem e, principalmente não está cumprindo o seu objetivo primeiro de "contribuir para facilitar, a todos, os meios para o livre acesso às fontes da cultura e o pleno exercício dos direitos culturais". Mas é preciso enxergar claramente que o que não funciona é o "modus operandi" de um mecanismo que deveria fomentar a cultura e hoje, no máximo beneficia alguns poucos e mesmos produtores de bens de cultura. É a forma emperrada de fazer a máquina funcionar e a total impossibilidade de uma avaliação dos projetos que receberam o selo "Lei de Incentivo à Cultura". Se estes estão realmente incentivando à cultura e se estão garantindo o referido "pleno exercício dos direitos culturais". Direito de participação na vida cultural do país, direito de produção e direito de fruição.

E que proliferem-se polifônicos diálogos!

Sustentabilidade

Reflexões sobre o consumo responsável

Le Monde Diplomatique Brasil*

O consumo está na ordem do dia. Para o bem e para o mal. Precisamos consumir para viver. A pergunta é: o que consumimos? O que tem a ver a necessidade humana de bem viver com a atual explosão do consumo, com a cultura do que é efêmero e descartável? O consumismo tornou-se uma grande armadilha para o ser humano e para o planeta. Até que ponto o consumo responsável pode ajudar na superação da atual crise de alimentos no mundo? Não podemos separar o movimento mundial pelo consumo responsável da necessidade de uma política de segurança alimentar para todos os seres humanos do planeta. O direito à alimentação deve ser associado ao consumo e à produção sustentáveis.

Em vez de sermos meros consumidores de um modelo econômico que impõe valores e produtos, optamos por uma consciência crítica como consumidores que desejam decidir sobre o que compram e o que comem, tendo em vista as nossas necessidades como seres humanos e não as necessidades do capital e ainda, as necessidades do planeta, com base nos princípios da simplicidade voluntária, da austeridade e da sustentabilidade.

A Declaração de Ahmedabad reflete esse novo contexto. De certa forma, ela lembra um pouco a primeira versão da Carta da Terra do Fórum Global da Rio-92, um chamado para a educação para uma vida sustentável. Os debates foram dominados pela presença de um pensamento central da obra de Gandhi: “minha vida é minha mensagem”. Sem dúvida, precisamos dar exemplo, precisamos ser a mudança que pregamos. Com criatividade e imaginação precisamos repensar e mudar nossos valores, nossas escolhas e as nossas ações. A sustentabilidade precisa ser concebida a partir de outros pontos de vista. Não só a partir da noção de desenvolvimento.

Em Ahmedabad, foi muito debatido o aquecimento global. Insistiu-se que, no que se refere a esse tema, o risco é planetário, mas as soluções são locais. A questão do clima não está separada da do crescimento econômico e a questão do crescimento econômico está ligada à relação entre as nações e às demandas por cooperação, eqüidade e transparência.

Precisamos comer para sobreviver, mas, diferentemente dos animais, não nos alimentamos por puro instinto. Comer é também um ato cultural. As sociedades o transformaram num ato social. Há uma variedade enorme de alimentos e há alimentos suficientes para todos os habitantes da Terra. Falta distribuí-los eqüitativamente. A melhor escolha da comida é aquela produzida localmente e a pior é a que vem empacotada, de longe, e que produz muito mais lixo (produtos industrializados) e mais custos sociais e ambientais. Trata-se de saber, de conhecer, como os produtos que consumimos foram produzidos. Conhecer todo o sistema de produção alimentar.


As recomendações de Ahmedabad destacaram a necessidade de um “novo sentido de urgência” e de um “novo paradigma”: precisamos redefinir a noção de progresso para sermos felizes e vivermos de forma sustentável e em paz. Porque, como dizia Gandhi, “o mundo tem o suficiente para atender as necessidades de todos, mas não para a ganância de cada um”.

Essa é a temática tratada no terceiro volume da série Le Monde Diplomatique Brasil. Com o título Reflexões sobre o Consumo Responsável, essa edição traz importantes subsídios para educadores, pesquisadores, movimentos populares e demais interessados a respeito dessa discussão tão atual, urgente e necessária. As contribuições que compõem esta edição vêm de quatro articulistas franceses e três latino-americanos, um deles brasileiro.


Logicamente, o assunto não se esgota aqui. Há muitas contribuições não contempladas, há muito a ser discutido, pensado, repensado. Por enquanto, são essas as sugestões que oferecemos para incentivar e enriquecer a reflexão.


Para ler a resenha completa ou adquirir o livro clique em sustentabilidade.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Mídia

Monopólio e centralidade da mídia – final

Hiran Roedel*


Nesse sentido, tudo deve obedecer à fábula da globalização que constrói o mito da democratização das condições de falar. Um mito que apresenta a globalização como a condição da horizontalidade, dado que os mercados se integram, agora, em rede. Não há hierarquia entre eles, pois o capital não mais se encontra limitado ao território, mas às possibilidades de circulação então geradas. Esse discurso se mantém extremamente vivo no mundo e no Brasil, em especial.

Neste, as condições do espetáculo também estão postas. A integração ao mercado global e a centralidade da mídia permitiram a lógica do mercado subsumir o campo político que passou a definir a “agenda” de seus debates. Ao mesmo tempo, os complexos midiáticos intimamente vinculados e dependentes das agências de notícias transnacionais, têm gerado e reproduzido o mesmo olhar unifocal ditado externamente.

O controle desses complexos por poucas famílias tem permitido definir as políticas para o campo comunicacional em que qualquer tipo de tentativa de regulação logo gera, com ar de denúncia, o discurso do atentado à liberdade de imprensa, à liberdade de expressão. Não se pode atrapalhar o livre jogo e circulação do capital que tem se manifestado no mundo pela concentração da propriedade da comunicação formando oligopólios, muitas vezes transnacionais, e no Brasil não é diferente.

Um processo que se iniciou no governo Sarney, quando se atraiu as mega-empresas de comunicação a partir da regulamentação das TV’s por assinatura, e se expandiu no governo FHC com a regulamentação da TV a cabo e TV por satélite. Por extensão, essas mega-empresas dominaram também o setor de publicidade onde das dez maiores empresas que atuavam, em 2001, no Brasil, somente três eram brasileiras[4]. Ou seja, o Brasil se integrara à lógica da globalização e, portanto, passávamos a ser abastecidos pelo olhar unifocal, enquanto o espetáculo assumia posição estratégica na produção do sentido e da compreensão da realidade.

Sob esse aspecto, a política brasileira também assumiu um caráter de espetáculo e passou a ser regida pelo mercado sufocando os espaços de manifestações democráticas. Afirmava-se, também no Brasil, a plutocracia, o que corresponde dizer que os principais atores políticos nacionais são homens de negócio ligados, inclusive, ao campo da comunicação. Isso demonstra o grande peso do aparato midiático na definição dos processos eleitorais. Observa-se, porquanto, o fato de que na Rede Globo, com 21 afiliadas, figuram como sócios os nomes de José Sarney, Fernando Collor de Mello, Garibaldi Alves, Albano Franco, a família de Antonio Carlos Magalhães e João Calisto Lobo. Já no SBT, com 17 afiliadas, temos Tasso Jereissati, Orestes Quércia, Jorge Maluly Neto e Paulo Pimentel, enquanto na Bandeirantes, com 9 afiliadas encontramos os nomes de Jader Barbalho, Geraldo Sampaio, Geraldo Melo, Júlio Campos e Romero Jucá . Todos políticos de projeção na política nacional ou regional.

Fica evidente a relação do campo da comunicação com o da política no dizer da produção do sentido. O entrelaçamento desses dois campos ao definirem a política como negócio impõe o imediatismo individualista e competitivo como regra, enquanto submete o Estado aos interesses dos mega-grupos empresariais. Nunca é demais lembrar que o capital internacional, desde 1997, pode participar em até 100% das empresas de telecomunicação e, com isso, abrindo espaço para a subsunção da mídia brasileira aos oligopólios globalizados.

Romper as barreiras impostas pelos oligopólios que submetem o campo midiático à lógica do mercado tem se demonstrado bastante limitado. A alternativa apresentada tem sido as TV’s comunitárias, mas que por alcance limitado não vêm conseguido furar os bloqueios da grande mídia em oferecer a produção e difusão de novos sentidos que apontem para a reordenação das relações sociais.

*Diretor da Plurimus
Referências

[1] SANTOS, Milton. Por uma outra globalização. Rio de Janeiro: Record, 2000, pp. 18-19.

[2] SANTOS, Milton. op. cit. p. 67.
[3] DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro: Contraponto, 1997, pp. 16-17.
[4] CAPARELLI, S. e LIMA, V. A. de. Comunicação e televisão: desafios da pós-globalização. São Paulo: Hacker, 2004, pp. 24-25.
[5] Ibidem, p. 31.

Cultura

DIÁLOGOS CULTURAIS

Simone Amorim*

Pela segunda vez o ministro da Cultura, Juca Ferreira, participou do debate da série Diálogos Culturais, que em segunda edição, nesta semana foi realizado em Salvador/BA. O primeiro deles ocorreu na semana anterior, no Rio de Janeiro/RJ. Os eventos, que têm como foco apresentar as alterações que se pretende fazer na Lei Rouanet, são introduzidos ao seleto público de convidados a partir de um diagnóstico sobre as distorções de funcionamento do mencionado mecanismo de incentivo à cultura - Lei Rouanet nº 8.313/91.

A proposta de projeto de lei do Governo Federal será disponibilizada futuramente no site do Ministério da Cultura para consulta pública, devendo permanecer disponível por 45 dias, depois dos quais será finalizada para envio ao Congresso Nacional no início do ano parlamentar, em fevereiro de 2009.

Os dados estatísticos apresentados pelo MinC são os mesmos que justificaram a criação do Programa Mais Cultura, em setembro deste ano e cabe a eles voltar: apenas 13% dos brasileiros freqüentam cinema alguma vez por ano, 92% dos brasileiros nunca freqüentaram museus, 93,4% dos brasileiros jamais freqüentaram alguma exposição de arte, 78% dos brasileiros nunca assistiram a espetáculo de dança, embora 28,8% saiam para dançar, mais de 90% dos municípios não possuem salas de cinema, teatro, museus e espaços culturais multiuso, o brasileiro lê em média 1,8 livros per capita/ano (contra 2,4 na Colômbia e 7 na França, por exemplo), 73% dos livros estão concentrados nas mãos de apenas 16% da população, o preço médio do livro de leitura corrente é de R$ 25,00, elevadíssimo quando se compara com a renda do brasileiro nas classes C/D/E, 56,7 % da população ocupada na área de cultura não têm carteira assinada ou trabalha por conta própria.

Na seqüência, uma série de informações sobre a atuação do Ministério desde 2003 expôs o cenário atual das políticas culturais no país, com a conclusão de que: “O MinC conseguiu ampliar os investimentos nos estados, regiões e segmentos culturais do país, apesar de um orçamento limitado e pouco representativo no conjunto de receitas da União”.

Só então, são apresentadas as bases racionais das alterações propostas: as distorções do modelo atual de financiamento da cultura; o questionamento se a distribuição do Incentivo Fiscal no país reflete a demanda cultural do Brasil – especificamente dada a extrema concentração de recursos na região sudeste e em segmentos culturais bastante específicos (para se ter uma idéia apenas 14% de todo o recurso oriundo da renúncia fiscal vai para os 30 menores segmentos, excetuando os de Artes Integradas, Teatro, Livros e Música Erudita); e a certeza de sobrecarga do modelo atual, além da precariedade no atendimento aos usuários do sistema.

A principal proposta, além da criação do Programa de Fomento e Incentivo à Cultura – PROFIC, é a de uma governança compartilhada entre poder público, segmentos culturais e a sociedade – e todas as implicações desta. Mudanças significativas estão no escopo de trabalho da reformulação da Lei Rouanet, sendo bastante salutar a forma com que o Ministro Juca Ferreira pretende validá-las: primeiramente anunciando em todos os seus canais que uma mudança estava a caminho, realizando fóruns e diálogos culturais com os segmentos impactados diretamente por essas mudanças, por meio de consulta pública em seu website e só então encaminhando o Projeto de Lei ao Congresso. Um excelente exemplo de como em alguns casos a estrada é tão importante quanto a chegada.

*Mestranda em “Bens Culturais e Projetos Sociais” no CPDOC – FGV, com pesquisa na área de Políticas Públicas do Livro e da Leitura no Brasil.


Nota:

Para mais informações sobre a reforma da Lei Rouanet, bem como a apresentação completa feita pelo Ministro da Cultura nos Diálogos Culturais clique em MinC.

Educação

Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos

No ano em que se comemoram 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e a Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH) da Presidência da República, apresentam o Prêmio Nacional de Educação em Direitos Humanos, que conta com o patrocínio e a execução da Fundação SM.

O prêmio foi lançado oficialmente no dia 6 de agosto, às 10h, em Brasília, na Sala de Atos do Ministério da Educação, com a participação do ministro da Educação, Fernando Haddad, o ministro da SEDH, Paulo Vannuchi, o secretário da Secad, André Lázaro, a diretora da OEI no Brasil, Ivana de Siqueira, o diretor da Fundação SM no Brasil, Igor Mauro, a vice-presidenta da Undime, Suely Duque Rodarte, a secretária-executiva do Consed, Vanessa Secchin e o coordenador do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos, Sólon Viola.

Até o dia 24 de outubro, instituições públicas e privadas de educação básica e superior e secretarias estaduais e municipais de educação poderão inscrever seus trabalhos de promoção dos Direitos Humanos e concorrer em quatro categorias, dotadas de R$ 100 mil em prêmios.

Extraído do site Educação em Direitos humanos. Para acesso ao conteúdo completo clique em Educação.

Tendências

Uma geração para alcançar a igualdade

Fábio Santos*

Em 20 anos, os negros terão uma renda familiar igual à dos brancos. Essa foi uma das conclusões de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e a manchete do Destak de ontem. Essa é uma daquelas notícias que podem ser lidas de duas formas: o copo está metade vazio ou metade cheio. Prefiro a segunda opção. Explico-me.

Segundo o Ipea, a tendência de redução da desigualdade de renda entre brancos e negros tem se mantido constante desde 1998. Ou seja, esse é um processo que vai demorar cerca de 30 anos. Isso quer dizer que temos a possibilidade real e concreta de, no espaço de uma geração, fechar uma das feridas mais profundas deixadas pela escravidão.

Claro, outras chagas vão permanecer, principalmente o preconceito de cor, pois esse está entranhado na cultura de algumas regiões. Mas se a diferença de renda for vencida, os comportamentos racistas – que hoje já são legal e socialmente reprimidos – vão se tornar cada vez mais raros.

Um outro estudo, divulgado ontem e elaborado pelo economista Marcelo Paixão, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, indica que a diferença de escolaridade entre negros e brancos vai acabar em 17 anos. Outra boa notícia.

Tanto o estudo de Paixão quanto o do Ipea parecem ter sido elaborados para sustentar a tese de que o Brasil precisa adotar políticas afirmativas radicais, como a criação de cotas raciais no ensino superior, para acabar com a desigualdade racial no país. A meu ver, porém, ambos apontam justamente na direção oposta.

O trabalho do Ipea é a demonstração cabal de que, se o país atacar as desigualdades sociais de uma maneira geral, as diferenças de cor também deixarão de ser importantes. A renda tem se tornado mais igual, diz o Ipea, por conta dos programas sociais criados pelo governo FHC e grandemente ampliados pelo de Lula. Ora, esses programas, como o Bolsa Família, não consideram a etnia dos seus beneficiários, mas apenas as suas condições sociais.

O problema das cotas é separar radicalmente o que, no Brasil, tende à unificação. A diferenciação entre negros e brancos é real, sem dúvida, mas é também arbitrária, já que a maioria da população é, na verdade, miscigenada.

Ah, mas é preciso andar mais rápido, alguém pode argumentar em favor das cotas raciais e de outras ações afirmativas radicais. Ora, se a idéia é pisar no acelerador, parece-me que o melhor seria mirar na origem das diferenças: a educação básica.

*Extraído do jornal Destak. Para acesso clique em Destak


Sustentabilidade

O discurso da sustentabilidade*

Ricardo Voltolini

Uma queixa comum entre as pessoas –especialmente os funcionários – é que o discurso da sustentabilidade costuma ser mais pródigo na boca de líderes empresariais do que a sua inserção nas estratégias de negócios. E isso ocorre em grande medida porque as corporações resistem ao novo e também a aceitar os custos, financeiros e comportamentais, da mudança. Em sua defesa, as empresas alegam que a mudança decorrente da incorporação do conceito ocorre lentamente porque requer a substituição de modelos de pensar e fazer negócios arraigados e a assimilação de novas práticas por parte de todos os colaboradores, parceiros de cadeia produtiva e consumidores.


A sustentabilidade representa o novo. E não se consegue criar o futuro utilizando esquemas mentais do passado. A respeito desse importante desafio, convém aos líderes de empresas sustentáveis lerem Presença: Propósito Humano e o Campo do Futuro (Cultrix, 2007). Escrito a oito mãos, por Otto Scharmer (Massachusets Institute of Tecnology), Joseph Jaworski (Global Leadership Inititative), Betty Flowers (Universidade do Texas) e Peter Senge, esta obra trata da construção de um novo tipo de saber e de uma nova forma de aprendizagem organizacional, válidos para o tema da sustentabilidade.


Os autores defendem que já não se pode mais planejar a mudança corporativa tomando como base apenas a experiência anterior, com a atenção voltada exclusivamente para o passado. Esse modelo de aprendizado, ainda predominante nas empresas, persiste nos processos de mudança planejadas, que se baseiam no velho roteiro de reunir informações, decidir, envolver pessoas, monitorar e controlar. A limitação desse esquema está no fato de que, invariavelmente, ele não permite uma compreensão profunda da situação nem o envolvimento necessário das pessoas para suportar a mudança em meio às pressões das circunstâncias.


Como alternativa a ele, os autores propõem uma teoria, denominada "U", que se estrutura em três etapas: sentir, presenciar e concretizar. Para Senge e sua troupe, esses três aspectos encontram-se presentes nos processos convencionais de mudança planejada. A diferença é que eles se tornam superficiais na medida em que escasseia o espaço para o "sentir". Reunir informações é um esforço insatisfatório –crêem – quando não vem acompanhado de uma suspensão nos modos habituais de ver e de um redirecionamento da atenção para perceber a situação "de dentro dela" e não como seu observador externo. Os autores acham que se não sentimos a "nova realidade", tendemos a reproduzir esquemas mentais preexistentes que serão cada dia menos eficazes para aprender em questões novas como a da sustentabilidade.


Os processos habituais de mudança receitam tomar decisões, criar uma "visão" inspiradora e botá-la na boca de um líder carismático que vai engajar pessoas. Para os idealizadores da teoria do U, esse modelo não leva em conta como os decisores sentem o tema, não permite que as pessoas descubram em si e vivenciem o valor de mudar, o que gera normalmente uma espécie de distanciamento do objeto proposto pela mudança. O problema dos discursos de sustentabilidade –segundo os autores – é que, na maioria dos casos, os públicos de interesse de uma empresa não o "presenciam." E se não o "presenciam", não conseguem perceber intimamente o seu significado mais amplo. Não é por acaso que, nas empresas consideradas modelares em sustentabilidade, os funcionários tomaram o tema para si como uma causa que transcende o próprio negócio e não como uma estratégia racional para proteger ativos ou manter a competitividade.


Nos esforços habituais de aprendizagem empresarial, prevalece um certo apego cego ao "plano de ação" e as etapas nele estabelecidas. Se por um lado isso ajuda, o plano acaba por reforçar – na análise do grupo de Senge – a separação entre os atores do processo e aquilo que desejam mudar. Para criar o futuro – defendem – deve-se agir "no mundo" e não "sobre o mundo."


O ato de "concretizar", que está na haste direita da "subida" do U pressupõe revelar uma realidade nova e construí-la coletivamente, a partir de um fluxo natural de mudança. Enquanto os objetivos de sustentabilidade forem apenas "declarações de propósitos elevados" em documentos bonitos que se penduram na parede, e o caminho para atingi-los deixar de considerar como as pessoas vivenciam o tema, a mudança necessária seguirá em ritmo lento e artificial. Para deleite dos céticos que se comprazem em associar o interesse das empresas pelo tema a puro estratagema de marketing.


*Extraído de Responsabilidade Social.com. Para acesso ao artigo completo clique em sustentabilidade.

Evento

Diretor da Plurimus fala sobre empreendedorismo em evento organizado pelo Conselho Regional de Odontologia e pelo Sesc

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Gestão

É possível uma nova Gestão Pública?

Daniel Roedel*
As décadas recentes foram varridas por uma onda autodenominada modernizante na economia, na gestão pública e privada e na educação. Nessa lógica, ser moderno virou sinônimo de defender arduamente a privatização de empresas públicas, execrar a presença do Estado na vida da sociedade, cursar MBA[1] como caminho mais rápido para o sucesso profissional, incorporar o vocabulário adotado pelo ambiente de negócios, utilizar no cotidiano ferramentas de gestão comuns ao ambiente empresarial privado, entre outros aspectos.

Embora de resultado muitas vezes duvidoso no próprio meio empresarial privado, governos e instituições públicas assumiram rapidamente, de um modo acrítico, essa prática como receita de sucesso e caminho essencial para não serem associados a uma imagem ultrapassada, (quem não se lembra do rótulo de jurássico utilizado contra aqueles que rejeitavam a supremacia absoluta do mercado?), mas sim reconhecidos como modernos e eficientes.

A forte ideologia presente nesse discurso dito modernizante nem sempre é perceptível de uma primeira vista. A retomada da orientação liberal na economia, liderada pelos governos de Margaret Thatcher na Inglaterra e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, no início dos anos 1980 criou as condições para a rápida disseminação e incorporação desse modelo de gestão, no qual o mercado foi reconhecido como demandante e o cidadão reduzido a um papel de cliente. Se para a gestão privada os resultados muitas vezes ficaram aquém dos propósitos, na gestão pública sua aplicação teve um efeito de certo modo devastador, uma vez que o foco dos governos e das empresas públicas é servir ao cidadão e à sociedade que têm participação política efetiva na orientação e nos destinos da ação de tais instituições. Ou seja, são muito mais do que simples clientes que adquirem produtos e serviços no mercado.

Não se trata, porém de negar absolutamente a validade da aplicação de ferramentas gerenciais. Deve-se ter apenas a compreensão de seus alcances e limitações. Uma gestão pública tem um compromisso político com fins que não se encontram ou se esgotam na eficiência de mercado. A decisão do gestor público tem uma dimensão sociopolítica que não é respondida simplesmente pela adoção de instrumentos e ferramentas que visem fundamentalmente ao resultado econômico-financeiro.

É o que a professora da UFMG, Ana Paula Paes de Paula relata em sua obra Por uma nova Gestão Pública, editada pela FGV (2007). No livro, a autora discorre sobre as origens desse discurso, sua aplicação em diversos países e a incorporação no Brasil. Mas não trata o assunto como uma inevitável capitulação, que enriqueceu gurus do management e disseminou escolas de gestão empresarial pelo mundo. Na parte final aborda experiências ainda bastante recentes que procuram adotar uma nova orientação na gestão pública, com destaque para a participação popular por meio de conselhos, fóruns e orçamento participativo.

Por uma nova Gestão Pública é bastante útil, principalmente para gestores públicos e privados, professores de cursos de graduação e de pós-graduação em administração, além de ser uma leitura que assume especial relevância num momento em que a “eficiência” econômico-financeira dos mercados está colocando o Estado novamente presente na vida pública.

É, portanto, leitura mais que recomendável.

*Diretor da Plurimus

Nota
[1] A respeito da forte presença dos cursos denominados MBA e dos modismos gerenciais leia o artigo Clonagem Arriscada de Thomaz Wood Jr, publicado recentemente neste blog.

Mídia

Monopólio e centralidade da mídia – parte I

Hiran Roedel*

O capital, a partir principalmente das três últimas décadas, desenvolveu amplamente sua capacidade de superar sua condição de dominação e se assumir como força hegemônica no mundo. Ou seja, uma posição legitimadora político-ideológica das relações sociais, em que a comunicação se apresenta validando o discurso gerado pela ordem do capital, estabelecendo o grau das tensões e o espaço onde elas devem ser percebidas pelo conjunto da sociedade. Diante disso, apresenta e interpreta as relações tensionadas impondo e orientando o olhar dos indivíduos que - presos a uma rede de relações e produções discursivas - são empurrados não para uma posição de reflexão sobre a realidade, pois o principal meio de produção de sentidos, a mídia, não objetiva a crítica, mas sim a legitimação da ordem social estabelecida por um único ponto de vista, onde não se tem espaço para questionamentos.


A ampla capacidade de sinergia demonstrada pela mídia da informação, possível pela infra-estrutura tecnológica de comunicação capaz de conectar em rede imensas distâncias no planeta, oferece, portanto, ao capital a condição de orientar as leituras de mundo de uma massa de pessoas independente do território. Tal condição faz com que não importe a língua, a etnia ou mesmo a classe social, mas sim o acesso à informação disponibilizada e distribuída de maneira ubíqua. Uma distribuição unifocal que se justifica em virtude da concentração dos conglomerados midiáticos globais.

De acordo com essa tendência de monopolização do campo comunicacional, vemos se afirmar uma produção do modo de pensar o mundo sustentado pela fabulação do discurso único que castra a possibilidade de questionamento. Os atores hegemônicos do mundo fazem crer - em nome de seus interesses financeiros - que a circulação de bens pelo planeta se tornou acessível a todos, em uma alusão à contração do tempo e do espaço[1] que amplia a sua oferta. Tal condição se tornou possível, de modo individualizado, pela centralidade midiática que orienta e oferta uma gama de produtos desterritorializados e que se reterritorializam no cotidiano das localidades.

Nesse sentido, observa-se o culto ao consumo ancorado num sentimento hedonista que condiciona o comportamento social, cuja base é o individualismo que põe em xeque as relações de solidariedade então existentes. O imediatismo imposto a partir do jogo discursivo hegemônico demonstra, desse modo, a impossibilidade de se pensar o futuro e de elaboração de projetos que não se enquadrem no aqui e agora, bem como na disputa e na concorrência que individualiza as relações.

A totalidade perde sua capacidade de orientar o poder público em suas intervenções no campo social e estas se apresentam em diligências fragmentadas cujo teor individualista se sobrepõe à coletividade, pois a ideologia da competição se afirma como regra do jogo político. Isso porque, nesse caso, a “política... é feita pelo mercado. Só que esse mercado global não existe como ator, mas como ideologia, um símbolo”[2]. No jogo político-discursivo, o Estado se omite frente às necessidades da grande maioria da população, minimizando suas ações para esta, como forma de fazer valer os interesses do grande capital do qual esse mesmo Estado já se encontra refém. Desse modo, as relações democráticas se transformam em relações plutocráticas no momento que a política se afirma enquanto negócio.

A fragmentação da realidade produzida pela intermediação deformante das agências de notícia que se encontram extremamente monopolizadas, pois não difundem notícias com o intuito de informar, mas sim a produzem para atender à lógica de circulação cada vez mais acelerada do capital, leva as pessoas a perderem a referência de conjunto. O excesso de informação não age para ampliar o conhecimento sobre o mundo, mas para formar a opinião a respeito desse, orientado pelo jogo político-discursivo ditado pelo olhar unifocal dos grandes conglomerados econômicos.

Afirma-se um modo de produção de sentido que gira incansavelmente em torno de si mesmo, do se apresentar e se mostrar, da produção de imagens que por serem veiculadas pela mídia ganham o status de verdade. Isso é o espetáculo cuja aparência se afirma com tal potencialidade, favorecida pela aceleração do tempo da circulação das mensagens, que impõe uma passividade embriagante de tal modo que conduz a sociedade sem que esta tenha o poder se opor. Gera um sentimento que
Não diz nada além de ‘o que aparece é bom, o que é bom aparece’. A atitude que por princípio ele exige [o espetáculo] é a da aceitação passiva que, de fato, ele já obteve por seu modo de aparecer sem réplica, por seu monopólio da aparência”[3].
O status midiático, nesse caso, assume importância que transcende o real valor do feito e por isso ganha o direito de circular e ser visto por todos. Mas quem decide? A decisão já foi tomada pela própria lógica do espetáculo dado que não importam mais as relações entre pessoas e/ou classes sociais, mas sim a aparência fetichista da objetividade que oculta as contradições do mundo real. A partir do frenesi hedonista do querer aparecer e se expor à mídia, afirma a conduta que, ao entender tudo como mercadoria, relega ao plano secundário o resultado e exalta o desenrolar dos acontecimentos, a imagem bombástica, sem a preocupação com o resultado. Tal lógica somente pode se sustentar quando o capital midiático se encontra sob a forma de monopólio, pois a incapacidade de réplica ao discurso hegemônico gera a condição para a afirmação do consenso em torno da ordem estabelecida.
*Diretor da Plurimus

Cultura

Cultura brasileira na clandestinidade*

Emir Sader

Foi tão importante e tão bonito, que a imprensa praticamente desconheceu. No dia 7 de outubro foram entregues as Ordens do Mérito Cultural 2008 no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, em belíssima cerimônia, que conquistou o direito de ser desconhecida pela imprensa privada.

Foi a 14ª versão do Prêmio, criado em 1995. Desta vez foram premiadas 49 pessoas – uma parte delas post-mortem – e instituições. Entre elas, o líder indígena Ailton Krenak, o cantor Altemar Dutra, o cineasta Anselmo Duarte, o artista Athos Bulcão, o dramaturgo Benedito Ruy Barbosa, os bossanovistas Carlos Lyra, Edu Lobo, Sergio Ricardo e o precursor Johnny Alf, as cantoras Elza Soares, Emilinha e Mercedes Sosa, os artistas Eva Todor, Dulcina de Moraes e Leonardo Villar, os escritores Guimarães Rosa, Milton Hatoum e Tatiana Belinky, o rapero Nelson Triunfo, os músicos Paulo Moura, Hans-Joachim Koellreutter, Roberto Corrêa e Pixinguinha, o grupo de dança Quasar, o cineasta Ruy Guerra, ao intelectuais Paulo Emilio Salles Gomes, Otávio Afonso, Vicente Salles e Emanoel Araujo, a fotógrafa Claudia Andujar, o critico de arte Marcantonio Vilaça, o diretor teatral Orlando Miranda, a artista plástica Teresa Aguiar.

Foram também premiadas a Associação Ashaninka do Rio Amônia, da Bacia Amazônica; a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT; a Associação Brasileira de Imprensa – ABI; a Associação Comunidade Yuba, de Mirandópolis, São Paulo, que luta pela preservação da cultura dessa comunidade; Bule Bule, músico, escritor, poeta repentista, ator e cantador, do interior da Bahia; Centro Cultura Piollin, entidade cultural da Paraíba; Coletivo Nacional de Cultura do MST, que desenvolve, entre tantas outras atividades, mais der 300 grupos de teatro, nos assentamentos nos quatro cantos do Brasil; Efigênia Ramos Rolim, artista plásticas popular do Paraná; Giramundo Teatro de Bonecos; a artista plástica Goiandira do Couto; o Instituto Baccarelli, de formação musical, situado em Heliópolis, São Paulo; João Candido Portinari, diretor do Projeto Portinari; Mestres da Guitarrada, movimento musical paraense; Música no Museu, do Museu Nacional de Belas Artes; e Zabé da Loca, música de 84 anos, tocadora de pífano.

Como vêem, demasiado brasileiro, demasiada auto-estima para poder receber atenção da imprensa. Nem para ouvir Elza Soares cantando o Hino Nacional, ou ouvir um solo de Paulo Moura, ou Sergio Ricardo cantando Te entrega Corisco, com cenas de Deus e o Diabo na Terra do Sol, ouvir a musica de Bule-Bule, escutar a Mercedes Sosa, a Nelson Triunfo e seus raperos e o conjunto de pífanos de Zabé da Loca.

No ano de lançamento da Ordem do Mérito Cultural, o então Ministro de Cultura Francisco Wefort inaugurou o prêmio atribuindo-o, entre outros a ACM (sic), a José Sarney, a Manoel Nascimento Brito e a Roberto Marinho. No segundo ano, 1996, Edemar Cid Ferreira, Olavo Setúbal, Sérgio Motta e Walter Moreira Salles. No ano seguinte foram agraciados como grandes beneméritos da cultura no Brasil, entre outros, Jorge Gerdau, José Ermirio de Moraes e José Safra. Em 1998, Lily Marinho (sic), Octávio Frias, Olavo Monteiro de Carvalho, Roseana Sarney e Ruy Mesquita.

Bastaria premiar aos grandes magnatas da imprensa privada, para que seus órgãos divulgassem, assim como os banqueiros e outros milhardários que costumam freqüentar as colunas sociais. Como ninguém da família Marinho, ou Frias, ou Mesquita, ou Civita, passou a freqüentar a lista dos premiados desde 2003, a cerimônia foi colocada na clandestinidade pela imprensa, na mentira do silêncio que merecem os grandes acontecimentos, políticas e fenômenos sociais, políticos, econômicos e culturais brasileiras.

Parabéns ao MINC, aos premiados e à Cultura Brasileira!


*Extraído da Agência Carta Maior. Para ler o artigo completo clique em Carta. Para mais informações sobre a premiação clique em Cultura.

Cultura

Oportunidade para (re)construir a Funarte*

O barco do presidente da Funarte afundou. Recebeu denúncia dos funcionários da instituição e foi acusado hoje, pelo jornal O Globo, de favorecer sua companhia de teatro, com aprovação privilegiada e captação de patrocínio da Petrobras. A questão reabre a discussão sobre a função política da Funarte.
Em abril de 2007, André Martinez propôs o seguinte fórum para discutir a instituição. Sua publicação neste espaço é pertinente, mesmo um ano e meio depois, considerando que a Funarte continua no mesmo lugar onde estava talvez mais enfraquecida com a gestão Frateschi:

“No caso da Funarte, os avanços promovidos durante o governo Lula eram urgentes e imprescindíveis para uma instituição que chegara à beira da sucata. Foco nas demandas de produtores e públicos, regulamentação das oportunidades, descentralização e ampliação de orçamentos. A Funarte incorporou o discurso da Política Gil e azeitou as máquinas para um salto que talvez possa dar agora, quando a experiência do Cultura Viva já enriquece substancialmente a inteligência política do MinC.

Uma Funarte ainda melhor precisaria estar preparada para flexibilizar a idéia política de arte, abarcando todas as suas possibilidades. Ver a arte exclusivamente sob o prisma dos modos de relação entre técnica e linguagem – plástica, música, teatro, dança – tende a uma política com foco nos aspectos econômicos equivalentes e na setorialização. Essa é uma medida compreensível enquanto as fontes criativas ainda contam apenas com a lei do mercado para sobreviver. Entretanto, a estruturação setorial das políticas e economias para as artes, além de cega para o impacto devastador das tecnologias digitais e da tomada das utopias pelo neoliberalismo, não dá conta da realidade de uma sociedade que ainda vive abaixo do limite da garantia integral dos direitos sociais e econômicos, impedida, portanto, de transitar livremente entre os setores artístico-profissionais. Sem uma visão socioeconômica monística, nem mesmo os mais abrangentes sistemas de profissionalização-cidadã serão capazes de consolidar uma economia solidária para a arte.

O Brasil é berço de novos cânones para as artes institucionalizadas. Mas a grande maioria da população é analfabeta em relação ao sentido dessa institucionalização e, dentro do paradigma, portanto, deficiente em produzir ou fruir. Ser brasileiro é a arte de viver e de viver a arte, mas a maior parte da população mal consegue sobreviver.

A Funarte deveria continuar fazendo tudo o que faz e cada vez melhor, mas precisaria começar a pensar mais profundamente em sustentabilidade e diversidade.

Os prêmios são importantes. Os espaços, os projetos de circulação, a documentação, tudo tem valor, tudo é necessário. Mas foram apenas mais uma vaga probabilidade para os 99% que não foram selecionados, que vivem onde não tem Funarte ou onde ela não chega. A Funarte pode e deve atender diretamente a demanda social, tudo deve ser feito para atenuar um pouco o sofrimento do capitalismo, afinal. Mas como geradora, articuladora e executora de políticas publicas, precisa debruçar-se na proposição de um modelo político para as artes, democrático e sustentável, para garantir autonomia econômica e criativa a todo cidadão sem ferir nenhuma liberdade atual ou futura.

A visão e a articulação setoriais são igualmente importantes. Arte precisa de economia e de instituições. Mas é necessário compreender que, além de setores articulados, precisamos de articulação entre setores e da constituição de outras visões políticas que não setoriais. Talvez haja muito mais gente produzindo ou querendo produzir teatro, circo, dança, música, cinema, arte visual, ou qualquer outra perspectiva que pareça não caber nestas categorias. A profissionalização e a “qualidade artística” não devem ser uma obrigatoriedade para o cidadão-artista. Não apenas conseguir que alguns artistas possam trabalhar (ainda que com concorrido e insuficiente financiamento público), mas, muito além, permitir que um espectro infinito de liberdades artísticas e estéticas faça parte de nosso projeto de sociedade, democratizando as idéias, as linguagens e as técnicas.

O Brasil tem sido apontado mundialmente como a nascente do novo. Uma responsabilidade que nos é atribuída por uma comunidade global aflita com sua sobrevivência. O novo é possível aqui porque nosso jeitinho se encarregou de bagunçar o velho, e, como rimos de tudo, vamos resistindo aos primeiros sintomas do colapso da ordem neoliberal. Pura arte. Talvez seja o fato de sermos a cultura universal amalgamada. Diversos, sofridos e criativos, transitamos com familiaridade entre todas as culturas e estéticas. E se nossa visão de arte é expandida, precisamos de políticas capazes de permitir a emergência de novas formas de criação ou produção, e de pensar sua sustentabilidade sem pudores ou traumas...”

*Extraído de Cultura e Mercado. Para ler o artigo completo clique em Funarte.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Responsabilidade Social

O que é Responsabilidade Social?

Leonor Ramos Chaves*

Vários caminhos podemos tomar para defini-la. Tecnicamente em seu conceito pós-moderno, vem da evolução do conceito de Desenvolvimento Sustentável e sua visão de mundo em três pólos: a economia, o meio-ambiente e a sociedade, mas podemos alocá-la como anterior a esses temas. Ela está ligada à Ética e ao conceito de cidadania.


Etimologicamente a palavra responsabilidade deriva do latim respondere, responder. Segundo o dicionário Aurélio, responsabilidade é “a qualidade de responsável”, que “responde pelos próprios atos ou pelos de outrem”, “que responde legal ou moralmente pela vida, pelo bem-estar, etc; de alguém.” No mesmo dicionário a palavra social designa “o próprio dos sócios de uma sociedade, comunidade ou agremiação: quadro social”, “que interessa à sociedade”. Responsabilidade Social segundo a definição do dicionário seria Responder pelo bem-estar do quadro social ou da comunidade, portanto, está ligada ao processo de cidadania.


Dallari (1998) define cidadania como a expressão de “um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.” Dallari ainda afirma que: “a cidadania não nos é dada, ela é construída e conquistada a partir da nossa capacidade de organização, participação e intervenção social.” A Responsabilidade Social é instrumento de intervenção social.


Já do ponto de vista da Ética e sendo esta a ciência que problematiza a moral, Responsabilidade Social remete ao que é costume – hábitos ligados às manifestações de cada comunidade através de suas tradições, vivências e crenças e de como estas acontecem no cotidiano. Assim, cada sociedade desenvolve seus valores e princípios suscetíveis à qualificação, considerando o adequado e moralmente corretos, dando-se importância a uma ligação direta entre discurso - a teoria - e ação - a prática -.


Cabe, então, à Responsabilidade Social se assentar sobre os conceitos da Ética, através de uma prática moral condizente com os direitos humanos mais elevados, da promoção da inclusão social ampla – a condição de cidadania – trabalhando para eliminar a discriminação seja ela cultural, racial e/ou ideológica e para tanto, não poderá se restringir ao assistencialismo. À Responsabilidade Social também deve caber à promoção do desenvolvimento sustentável incluindo em suas práticas a visão tripolar do mundo, levando em consideração na sociedade, a economia e o meio-ambiente.


Isso posto, a Responsabilidade Social pode ser definida como a íntima convicção social que determina norma ou conjunto de obrigações, ainda que não reconhecidas como matéria de Direito Formal, mas que pertencem ao campo da ética dos princípios ideais da conduta humana. É o processo resultante do desenvolvimento de posturas éticas inerentes aos estágios de evolução de determinados grupos/instituições/organismos sociais.


Na verdade, é no exercício da cidadania que se dá sua melhor definição. À medida que exercemos a Responsabilidade Social em seus mais variados níveis, seja como cidadãos comuns, empresas, comunidades, instituições governamentais e outras, é que podemos nos permitir compreender, com mais propriedade, as diversas questões que hoje são formadoras de exclusão (e o que fazemos individual e coletivamente para perpetuar esses esquemas) e ajuda-nos a intervir, de forma positiva e mais consciente, criando redes inclusivas.


A Psicossociologia já afirma que para se mudar algo no social é necessário mudar o seu significado, suas representações e logo, seu simbolismo no sentido coletivo. O Exercício da Responsabilidade Social pode ser uma importante ferramenta nesse sentido, trazendo idéias inovadoras, dando diferentes sentidos e arranjos a coisas antigas, pode construir o novo. Em ações coletivas inovadoras – inclusivas – construímos a capacidade de exercer a cidadania tanto a nossa como a do “outro” e com ela, todas as responsabilidades que lhe são inerentes, inclusive a social.
*Mestre em psicossociologia e consultora de empresas

Referências:

DALLARI, D. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo, Moderna, 1998.
GRAJEW, Oded. O que é responsabilidade social. Mercado global. São Paulo, Ano 27 nº 07, junho de 2000.
MAGALHÃES, N. O. B. Catálogo de Serviços do Terceiro Setor – A inserção do Design de Moda no âmbito da Responsabilidade Social. (Monografia de Bacharelado) – Design de Moda – Faculdade SENAI/CETIQT, Rio de Janeiro, 2007.

Cultura

Resultado da nossa enquete: a diversidade cultural do país tem alcançado mais visibilidade no governo Lula?

  • Sim. As iniciativas governamentais têm favorecido manifestações das diversas culturas. 46%
  • Não. O governo tem reforçado as mesmas restritas expressões de cultura predominantes no país. 54%

Nossa opinião

A potencialização da diversidade cultural de um país não necessariamente tem ligação direta com uma maior visibilidade de expressões variadas da cultura, e, sobretudo, das artes. Até porque visibilidade, em alguns casos remete mais à massificação que à participação ampla.

A percepção predominante – nesta enquete – de que o atual governo não tem favorecido à diversidade, carece, é claro, de rigor empírico para figurar como afirmativa-reflexo de uma situação experimentada e comprovada, porém, uma lista considerável de exemplos que ratifiquem tal afirmativa poderia ser apresentada, o mais atual e polêmico é a concentração dos recursos oriundos de renúncia fiscal do governo – leis de incentivo à cultura – na região sudeste.

Uma discussão que se prolonga há anos e que o atual governo não foi capaz de avançar. De um lado, produtores populares de cultura que não acessam tais recursos (pelos mais variados motivos, que poderemos elencar oportunamente), de outro, um governo, que ainda não conseguiu elaborar uma resposta à essa demanda urgente pela possibilidade de que uma miríade de expressões legítimas de nossas culturas ganhem maior visibilidade.

Gestão

Clonagem arriscada*

Thomaz Wood Jr

Analisada a superfície, o campo da Administração de Empresas é um grande sucesso. Nos Estados Unidos, pátria mãe do management, os indicadores são invejáveis. Em 1975, existiam 35.758 programas de MBA. Em 2000, o número havia subido para 112.258. A demanda por conhecimento na área fez florescer um ramo da indústria editorial, com livros e revistas especializados. A Harvard Business Review, título mais popular do gênero, tem uma circulação estimada de 500 mil exemplares, sendo 50% fora dos EUA. Com a globalização, proliferaram também as empresas de consultoria e os programas de educação executiva, um filão lucrativo para as escolas de negócios. Em paralelo, surgiu uma vigorosa comunidade acadêmica, voltada para o desenvolvimento do conhecimento no campo. A Academy of Management, principal organização, conta hoje com quase 18 mil membros e suas revistas científicas estão entre as mais citadas no meio.

Nas últimas décadas, o modelo norte-americano ganhou o mundo. A sigla MBA passou a ser vendida como passaporte para o sucesso profissional nas mais diversas latitudes. Os livros de pop-management e os gurus da gestão cruzaram oceanos, encontraram platéias dóceis e fascinadas e produziram clones locais. Até mesmo o modelo de organização científica foi exportado. Existe hoje uma European Academy of Management, uma Asian Academy of Management e até uma Ibero-american Academy of Management.


Curiosamente, não há encontro científico sério que não discuta a crise no campo. Primeiro, veio o ilustríssimo Henry Mintzberg, a desancar o modelo MBA, acusando-o de formar atores perigosos, capazes de causar grandes prejuízos às empresas. Depois vieram Jeffrey Pfeffer e Christina T. Fong, a sugerir que os programas de MBA significavam mais uma interrupção do que um impulso na carreira. Seguiram-se críticas à comunidade científica e sua forte tendência a se tornar uma torre de marfim, autocentrada, incapaz de produzir pesquisa relevante para a prática, e ignorada pelos executivos.


Em um ensaio publicado recentemente no Academy of Management Journal, Rita G. McGrath, da Columbia University, admite e disseca a crise. Segundo a pesquisadora, o sistema criou e institucionalizou práticas que se tornaram anacrônicas. A crise é confirmada pelo aumento das críticas, pela perda de prestígio dos programas de MBA e pela crescente percepção de que a pesquisa no campo tende a ser inútil para a prática gerencial.


Pindorama, entre outras nações, também mimetizou o modelo em crise, com adaptações e distorções. Nos anos 1990, por aqui explodiu o número de programas de Administração de Empresas. A qualidade, como esperado, não acompanhou a quantidade. Nas escolas-hotel, preocupadas em extrair a máxima ocupação de suas salas de aula, os professores são contratados em regime precário e induzidos a longas jornadas, em troca de pequenos salários. Sorte similar tiveram os programas de MBA. A sigla foi tão usada e abusada que perdeu o sentido original. Transformou-se em um contrato de compra de diploma a prestação: uns fingem que aprendem, outros fingem que ensinam, algumas moedas trocam de mãos e a vida segue seu curso.


Enquanto isso, a academia local, como outras, tenta simular os vizinhos do Norte. A cada ano, são gerados milhares de artigos de duvidoso rigor e improvável utilidade. Aqui, como lá, críticos há, geralmente entre os mais experientes. Aqui, como lá, também não faltam bons propósitos e inovações. Aqui, como lá, entretanto, mantém o sistema uma anacrônica malha de práticas e processos, alimentada pelo baixo clero burocrático e por outras tantas almas, amantes do status quo. De seu lado, nem sempre atendidas pelas instituições de ensino, as empresas ensaiam, com resultados heterogêneos, soluções para suas demandas de treinamento e desenvolvimento: criam universidades corporativas e contratam pequenas empresas e profissionais autônomos.


Qual o futuro das escolas de negócios? McGrath e colegas sugerem medidas práticas para mudar o quadro, tais como atrair para as escolas professores de tempo parcial, com experiência executiva, incentivar a pesquisa aplicada, desenvolver programas mais curtos e afinados com as demandas dos estudantes e das empresas e aproximar a pesquisa do ensino. Lá, como cá, motivos para mudar não faltam. Porém, os daqui são mais prementes. Pindorama permanece um rincão mal gerido, suas organizações de todos os naipes a desperdiçar recursos e perder oportunidades. Os primeiros 50 anos da Administração de Empresas no País não estiveram à altura das necessidades. Talvez os próximos possam ser um pouco melhores.

*Extraído de Carta Capital. Para acesso ao artigo na revista clique em Thomaz Wood Jr