quinta-feira, 23 de abril de 2009

Favela


Resultado de nossa enquete: você é a favor da colocação de muros para conter a expansão das favelas sobre as matas?


  • Sim, é preciso preservar a mata atlântica 16%
  • Sim, é preciso conter a expansão das favelas 7%
  • Não, as favelas se expandem por falta de políticas públicas 55%
  • Não, as favelas continuarão se expandindo 22%

Nossa opinião


De fato, o resultado da enquete confirma o que tem sido apontado em enquetes similares, realizadas pela mídia nas últimas semanas. A prática comumente adotada de esconder a miséria e a violência colocando-os em guetos parece que não encontra mais respaldo na sociedade civil. Não se trata, porém, de sermos negligentes com a nossa mata. É claro que ela precisa ser preservada. E a miséria é um dos causadores de problemas ambientais. No entanto, a proposta não parece ser nessa direção. Mantém as precárias condições de vida das populações que habitam essas comunidades carentes e não enfrenta os causadores dos problemas ambientais, inclusive a especulação imobiliária.

Neoliberalismo

Rumo ao “capitalismo total”?*


Dany-Robert Dufour

O neoliberalismo não visa apenas à destruição das instâncias coletivas construídas ao longo do tempo (família, sindicatos, partidos e, de uma maneira mais geral, a cultura), mas também à da forma indivíduo-sujeito surgida durante o período moderno[1]. A fábrica do novo sujeito “pós-moderno”, não-crítico e “psicotizante”, resulta de um projeto perigosamente eficiente, no centro do qual se encontram duas importantes instituições que se dedicam devotadamente à sua execução: a televisão e uma nova escola, sensivelmente alterada por trinta anos das chamadas reformas “democráticas” – que sempre operaram no sentido de enfraquecer a função crítica.

O embrutecimento das crianças pela televisão começa muito cedo. Quando chegam à escola, já vêm empanturradas da telinha desde a mais tenra idade. O fato de se verem diante de um televisor antes de falarem é novo, do ponto de vista antropológico. O consumo de imagens chega a cinco horas por dia, nos Estados Unidos.

O colapso do universo simbólico

A inundação do espaço familiar por essa torneira permanentemente aberta, de onde escorre um fluxo ininterrupto de imagens, tem efeitos consideráveis na formação do futuro sujeito. É comum questionar-se o conteúdo mesmo das imagens, denunciando, por exemplo, a sua violência, sem se ter consciência de que o próprio veículo pode ser perigoso, transmita ele o que transmitir.

*Extraído de Le Monde Diplomatique Brasil. Para acesso completo clique em Diplo.


[1] Ler, de Dany-Robert Dufour, “As angústias do indivíduo-sujeito”, Le Monde diplomatique, fevereiro de 2001. A modernidade, segundo o grande historiador Fernand Braudel, nasce “em algum lugar, entre 1400 e 1800”: é, portanto, contemporânea do capitalismo.


Nossa opinião

Embora o artigo tenha sido publicado em 2001 consideramos seu conteúdo bastante atual e oportuno para o entendimento da atual crise presente na globalização dos mercados.

Crise global

Socialismo fracassou, capitalismo quebrou: o que vem a seguir?*

Eric Hobsbawm - The Guardian

Seja qual for o logotipo ideológico que adotemos, o deslocamento do mercado livre para a ação pública deve ser maior do que os políticos imaginam. O século XX já ficou para trás, mas ainda não aprendemos a viver no século XXI, ou ao menos pensá-lo de um modo apropriado. Não deveria ser tão difícil como parece, dado que a idéia básica que dominou a economia e a política no século passado desapareceu, claramente, pelo sumidouro da história. O que tínhamos era um modo de pensar as modernas economias industriais – em realidade todas as economias -, em termos de dois opostos mutuamente excludentes: capitalismo ou socialismo.

Conhecemos duas tentativas práticas de realizar ambos os sistemas em sua forma pura: por um lado, as economias de planificação estatal, centralizadas, de tipo soviético; por outro, a economia capitalista de livre mercado isenta de qualquer restrição e controle. As primeiras vieram abaixo na década de 1980, e com elas os sistemas políticos comunistas europeus; a segunda está se decompondo diante de nossos olhos na maior crise do capitalismo global desde a década de 1930. Em alguns aspectos, é uma crise de maior envergadura do que aquela, na medida em que a globalização da economia não estava então tão desenvolvida como hoje e a economia planificada da União Soviética não foi afetada. Não conhecemos a gravidade e a duração da atual crise, mas sem dúvida ela vai marcar o final do tipo de capitalismo de livre mercado iniciado com Margareth Thatcher e Ronald Reagan.

A impotência, por conseguinte, ameaça tanto os que acreditam em um capitalismo de mercado, puro e desestatizado, uma espécie de anarquismo burguês, quanto os que crêem em um socialismo planificado e descontaminado da busca por lucros. Ambos estão quebrados. O futuro, como o presente e o passado, pertence às economias mistas nas quais o público e o privado estejam mutuamente vinculados de uma ou outra maneira. Mas como? Este é o problema que está colocado diante de nós hoje, em particular para a gente de esquerda.

*Extraído de Carta Maior. Para acesso ao artigo completo clique em Carta.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Favela

Saramago critica colocação de muros nas favelas do Rio de Janeiro

O renomado escritor português José Saramago criticou em seu blog a decisão do governo do Estado do Rio de Janeiro de colocar muros para cercar as favelas.


Clique em Saramago para ler a matéria Raposa do Sol.

Se você conhecer alguma opinião na mídia favorável à colocação de muros nas favelas do Rio, nos informe que divulgaremos.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Cultura

Todo Objeto Desnatura a Arte

Simone Amorim*

“A ausência de finalidade externa é, de algum modo, compensada pela densidade das finalidades internas, ou seja, pelas relações entre as partes e os elementos da obra. Graças à arte, o ser humano pode atingir o absoluto”. Esse fragmento denota com bastante precisão o objetivo central do pequeno texto recém-lançado no Brasil sob o título A Literatura em perigo, do historiador e ensaísta búlgaro Tzvetan Todorov.

Ao lançar mão de sua experiência literária para corroborar a intenção de reforçar o papel central da arte pela arte, na verdade, o dedicado discípulo de Roland Barthes constrói com muita simpatia um texto cativante que aos poucos vai-nos envolvendo ao mesmo tempo em que sensibilizando para grandes questões atropeladas pela experiência burocrática de [des]encontro com as artes e a literatura em especial.

Ao denunciar que a escola não ensina do que se trata uma obra, mas antes do que falam os críticos, registra sua diatribe à experiência estética condicionada a padrões apreendidos de forma estéril, por um agente [escola] que em lugar de representar o local da cultura e das artes, pretende-se uma fábrica de pequenos [e amadores] críticos literários. E enquanto isso o processo criativo fica mais pobre e a experiência sublime que daí adviria; natimorta em seu prematuro equívoco deixa de se concretizar.

É válida a leitura do texto, senão pelas qualidades textuais e históricas de suas referências, também para desnudar a imposição na atualidade, de uma concepção estreita da literatura que a desliga do mundo.

A partir de um referencial extremamente interessante – seu próprio amor à literatura e ao livro – afirma que a Literatura está em perigo – acrescento que também as Artes de um modo geral – quando o acesso ao seu conteúdo não se dá com o objetivo essencial de resgatar “o grande diálogo entre os homens”, experiência estética de fruição da arte.

Em um momento em que o Estado Brasileiro se prepara para rever as suas políticas públicas de cultura, notadamente a principal delas – a Lei federal de incentivo à cultura – parece-me bastante apropriado considerar essa “janela” de provocação que vem ao encontro de uma perspectiva amadurecida do ato de acessar objetos de cultura – quais sejam os livros e demais objetos de leitura.

TODOROV, T. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.96p.

*Mestre em Patrimônio Histórico e Bens Culturais e especialista em Leitura.

Desenvolvimento

Resultado de nossa enquete: é possível compatibilizar desenvolvimento econômico e desenvolvimento social?

  • Sim. Se não houver desenvolvimento social não haverá desenvolvimento, apenas crescimento econômico. 54%
  • Não. Os modelos atualmente predominantes no mundo valorizam apenas os aspectos econômicos em detrimento do desenvolvimento social. 31%
  • O desenvolvimento social é consequência natural do desenvolvimento econômico. 15%

Nossa opinião

Por muitas décadas predominou a visão de que crescendo a economia, o desenvolvimento social seria uma consequência natural. No entanto, essa visão estritamente econômica concentrou renda, aumentou a miséria e devastou o planeta. O resultado de nossa enquete demonstra a compreensão de que é preciso mais do que “crescer o bolo”, como se dizia no período da ditadura militar.

Crescimento e desenvolvimento não são sinônimos! E o desenvolvimento não pode ser reduzido ao aspecto econômico, como a lógica do mercado tenta impor. Exemplo dessa ideia é o Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, que se contrapondo ao indicador do Produto Interno Bruto – PIB, que mede apenas o crescimento econômico, inclui indicadores como acesso à educação, expectativa de vida e condições de habitação como argumentos contundentes para se considerar a melhoria das condições de vida das pessoas.

Também a visão de desenvolvimento sustentável, representada, por exemplo, pela Agenda 21, se insere como alternativa ao considerar o desenvolvimento humano e ambiental como prioritários. Portanto, pensar e projetar desenvolvimento significa articular e harmonizar as perspectivas econômica, social e ambiental. Tudo isso sem desconsiderar que nesse modelo predominante de globalização de mercados, o viés do local é agenda obrigatória para consolidar o desenvolvimento que valorize suas vocações (ou crie novas), características e potencialidades. E que considere a participação efetiva de seus atores, principalmente a sociedade civil.

Nosso tempo

Sociedade e tédio*

Olgária Mattos**

“Sociedade do conhecimento” e “técnicas da informação” constituem a aceleração do tempo, baseada na circulação ininterrupta das revoluções tecnológicas e do capital no mercado financeiro. Diferentemente da noção de crise econômica, o atual impasse é cultural, é crise da cultura que perdeu autonomia, adaptada agora às contingências da financeirização e dos sofismas políticos de que é portadora,como as indústrias do conhecimento.

Estas promovem os saberes a serviço exclusivo da economia, abrangendo todos os aspectos da vida, do mundo do trabalho aos laços afetivos, da intimidade até a educação. Seu poder de controle se expressa em uma cultura da incuriosidade, uma sociedade desmotivada e sem projeto, dominada pela “queda tendencial do valor espírito” e de sua capacidade de criar e reconhecer valores, mundo empobrecido pelo extraordinário achatamento da experiência do tempo, plasmado na imediatez e na pressa.


O homem contemporâneo só tem tempo para suas urgências; sua curiosidade é insaciável, mas se contenta com pouco.


Eric Fromm refere-se ao traço do presente que consiste em “fazer de tudo para economizar tempo e, quando o conseguimos, nós o matamos porque não sabemos o que fazer com ele.” Nos anos 1840, Marx analisava o trabalho alienado escrevendo que o trabalhador, quando no trabalho, está fora de si, porque não realiza uma livre atividade física e espiritual, mas martiriza seu corpo e arruína seu espírito. Só se sente junto a si mesmo quando fora do trabalho. Na modernidade, fora do trabalho tampouco o trabalhador se encontra junto a si, o indivíduo tendo perdido o controle dos usos do tempo e de sua própria vida. A organização institucional do tempo é um dos atributos mais eminentes da dominação.


O sentimento de não se ter tempo abrange a sociedade inteira, não apenas quem se encontra sobrecarregado de trabalho, mas também os desempregados, todos respirando “uma atmosfera carregada de comunicação”, preenchida pelas indústrias de entretenimento e de cultura de massa, adaptadas ao homem desumanizado e supérfluo. O “turbo-capitalismo” produz exclusão e concorrência, estresse e depressões, inviabilizando laços duradouros. Perda do tempo é perda de autonomia e de experiência. Por isso Walter Benjamin escreveu que “as rugas em nosso rosto são as assinaturas das grandes paixões que nos estavam destinadas, mas nós, os senhores, não estávamos em casa”.


A circulação e o acúmulo do capital determinam tempos mortos e movimento perpétuo, indigência e vulnerabilidade, circunstância que se manifesta no “tédio dos jovens das periferias”, na fragilização do sentido de pertencimento a um mundo comum, sentimento de desvalorização de si, com o déficit simbólico que isso implica.


O capitalismo contemporâneo manifesta seu ethos anti-comunicativo, pois dissolve as condições da comunicação de valores e experiências, reduzida a simples instrumento de troca e de informação. Substituindo o “desejo de ser livre” pelo mudança incessante, o capitalismo não preenche necessidades mas as multiplica, gerando frustração e tédio. Razão pela qual em 1968 o maio francês grafitou nos muros de Paris: “ não mude de emprego, mude o emprego de sua vida”.


*Extraído de Agência Carta Maior.

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*Filósofa, professora titular da Universidade de São Paulo.