quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Gestão

É possível uma nova Gestão Pública?

Daniel Roedel*
As décadas recentes foram varridas por uma onda autodenominada modernizante na economia, na gestão pública e privada e na educação. Nessa lógica, ser moderno virou sinônimo de defender arduamente a privatização de empresas públicas, execrar a presença do Estado na vida da sociedade, cursar MBA[1] como caminho mais rápido para o sucesso profissional, incorporar o vocabulário adotado pelo ambiente de negócios, utilizar no cotidiano ferramentas de gestão comuns ao ambiente empresarial privado, entre outros aspectos.

Embora de resultado muitas vezes duvidoso no próprio meio empresarial privado, governos e instituições públicas assumiram rapidamente, de um modo acrítico, essa prática como receita de sucesso e caminho essencial para não serem associados a uma imagem ultrapassada, (quem não se lembra do rótulo de jurássico utilizado contra aqueles que rejeitavam a supremacia absoluta do mercado?), mas sim reconhecidos como modernos e eficientes.

A forte ideologia presente nesse discurso dito modernizante nem sempre é perceptível de uma primeira vista. A retomada da orientação liberal na economia, liderada pelos governos de Margaret Thatcher na Inglaterra e de Ronald Reagan nos Estados Unidos, no início dos anos 1980 criou as condições para a rápida disseminação e incorporação desse modelo de gestão, no qual o mercado foi reconhecido como demandante e o cidadão reduzido a um papel de cliente. Se para a gestão privada os resultados muitas vezes ficaram aquém dos propósitos, na gestão pública sua aplicação teve um efeito de certo modo devastador, uma vez que o foco dos governos e das empresas públicas é servir ao cidadão e à sociedade que têm participação política efetiva na orientação e nos destinos da ação de tais instituições. Ou seja, são muito mais do que simples clientes que adquirem produtos e serviços no mercado.

Não se trata, porém de negar absolutamente a validade da aplicação de ferramentas gerenciais. Deve-se ter apenas a compreensão de seus alcances e limitações. Uma gestão pública tem um compromisso político com fins que não se encontram ou se esgotam na eficiência de mercado. A decisão do gestor público tem uma dimensão sociopolítica que não é respondida simplesmente pela adoção de instrumentos e ferramentas que visem fundamentalmente ao resultado econômico-financeiro.

É o que a professora da UFMG, Ana Paula Paes de Paula relata em sua obra Por uma nova Gestão Pública, editada pela FGV (2007). No livro, a autora discorre sobre as origens desse discurso, sua aplicação em diversos países e a incorporação no Brasil. Mas não trata o assunto como uma inevitável capitulação, que enriqueceu gurus do management e disseminou escolas de gestão empresarial pelo mundo. Na parte final aborda experiências ainda bastante recentes que procuram adotar uma nova orientação na gestão pública, com destaque para a participação popular por meio de conselhos, fóruns e orçamento participativo.

Por uma nova Gestão Pública é bastante útil, principalmente para gestores públicos e privados, professores de cursos de graduação e de pós-graduação em administração, além de ser uma leitura que assume especial relevância num momento em que a “eficiência” econômico-financeira dos mercados está colocando o Estado novamente presente na vida pública.

É, portanto, leitura mais que recomendável.

*Diretor da Plurimus

Nota
[1] A respeito da forte presença dos cursos denominados MBA e dos modismos gerenciais leia o artigo Clonagem Arriscada de Thomaz Wood Jr, publicado recentemente neste blog.

Um comentário:

Anônimo disse...

Concordo. É preciso desmistificar o sucesso da gestão empresarial privada. A realidade tem mostrado outra coisa: crises, insucessos, abarrotamento de queixas nos procons, etc.