quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Educação

A relação instrumental entre a elite brasileira
e a universidade - final


Regina Lima Feitosa*

O acesso à educação básica foi estendido à grande maioria das pessoas e vem aumentando o número daquelas que têm acesso ao ensino superior. Mas, muitos autores ao estudarem os processos de certificação pelos quais os indivíduos passam, apontam que o valor de cada diploma é pesado diferentemente no campo da empregabilidade de acordo com o grupo social ao qual cada indivíduo pertence. Portanto, as relações sociais (essência para o acúmulo do capital social), na maioria das vezes, conquistadas através da família seriam um dos diferenciais na hora de conseguir um emprego. A ‘igualdade’ de oportunidades de se ‘diplomar’ teria relação diretamente proporcional ao fato da desigualdade de chances de conseguir um emprego. Argumenta Maria Alice Nogueira, a partir de uma análise bourdiesiana:
Esse efeito de depreciação relativa, oriundo da multiplicação do contingente de diplomados leva a uma intensificação da utilização da escola, por parte das categorias já – anteriormente – utilizadoras dela, e a uma desilusão, por parte dos novos utilizadores, no que se refere às aspirações que nutriam em relação às credenciais escolares obtidas. É no seio destes últimos que o processo de desvalorização faz suas maiores vítimas, pois que, em geral são privados de outras espécies de capital (em particular o capital social), capazes de rentabilizar seu certificado escolar. (NOGUEIRA,1998)
A proposta deste ensaio era discorrer sobre as práticas da elite, focando na percepção que ela tem sobre a escola e como ela se utiliza dela e dos simbolismos oferecidos para permanecer no poder. Mas, não podemos pensar em reprodução social sem refletir sobre todos os atores e mecanismos envolvidos na legitimação de uma elite. Assim, faz-se necessário pensar nas políticas públicas que vêm sendo adotadas nos últimos anos, a partir da “Constituição Cidadã”, para diminuir as distâncias sociais. A universalização do acesso à educação desde então é apregoado como meta. Como pensar na igualdade de direitos e oportunidades já que o acesso à escola não é mais um privilégio?

Um caminho que poderíamos seguir para pensar essa questão seria o apontado por Sen quando discorre sobre a igualdade utilizada para legitimar a desigualdade. “Faz-se a justificação da desigualdade em algumas características repousar na igualdade em alguma outra característica, como mais básica neste sistema ético.” (SEN, 2001). A essa idéia poderíamos encontrar uma complementaridade com a reflexão de Bourdieu a respeito do aumento do contingente de diplomados que desemboca num processo que ele denomina ‘eliminação branda’. Segundo o autor, aumentar o número de diplomados com origem precária de capitais culturais e sociais não garantiria a absorção pelo mercado de trabalho, pois, o diploma teria peso a partir de um capital social que o avalizasse.

Quando se pensa sobre a manutenção de uma elite no poder há de se refletir sobre os mecanismos não evidentes e que têm contribuído para sua reprodução e legitimação. Um dos maiores obstáculos à repartição das riquezas sociais é acreditar na liberdade total do indivíduo para fazer suas escolhas com direito ao mérito pelas mais acertadas. A Sociologia vem contribuir com essa reflexão:

[...] é através da ilusão de liberdade em relação às determinações sociais que se dá a liberdade de se exercerem as determinações sociais. [...] Paradoxalmente, a sociologia liberta libertando da ilusão de liberdade, ou, mais exatamente, da crença mal colocada nas liberdades ilusórias (BOURDIEU).
*Mestranda de Bens Culturais e Projetos Sociais na FGV-RJ

Referências

ALMEIDA, Ana Maria F. & NOGUEIRA, Maria Alice, (Orgs.), A escolarização das elites, 2ª edição, Vozes, 1998.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico, 10ª Edição. Bertrand Brasil, 2007.
__________, Questões de Sociologia, Editora Marco Zero, 1983.
MEDEIROS, Marcelo. O que faz os ricos ricos. São Paulo: Hucitec, 2005
POCHMANN, Márcio. Atlas da exclusão social no Brasil. São Paulo: Cortez, 2003.
SEN, Amartya. Desigualdade reexaminada. Record,2001.
WEBER, Max. Ensaios de Sociologia. 2a edição, Rio de Janeiro, Zahar, 1971.

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