sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Responsabilidade Social

O que é Responsabilidade Social?

Leonor Ramos Chaves*

Vários caminhos podemos tomar para defini-la. Tecnicamente em seu conceito pós-moderno, vem da evolução do conceito de Desenvolvimento Sustentável e sua visão de mundo em três pólos: a economia, o meio-ambiente e a sociedade, mas podemos alocá-la como anterior a esses temas. Ela está ligada à Ética e ao conceito de cidadania.


Etimologicamente a palavra responsabilidade deriva do latim respondere, responder. Segundo o dicionário Aurélio, responsabilidade é “a qualidade de responsável”, que “responde pelos próprios atos ou pelos de outrem”, “que responde legal ou moralmente pela vida, pelo bem-estar, etc; de alguém.” No mesmo dicionário a palavra social designa “o próprio dos sócios de uma sociedade, comunidade ou agremiação: quadro social”, “que interessa à sociedade”. Responsabilidade Social segundo a definição do dicionário seria Responder pelo bem-estar do quadro social ou da comunidade, portanto, está ligada ao processo de cidadania.


Dallari (1998) define cidadania como a expressão de “um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.” Dallari ainda afirma que: “a cidadania não nos é dada, ela é construída e conquistada a partir da nossa capacidade de organização, participação e intervenção social.” A Responsabilidade Social é instrumento de intervenção social.


Já do ponto de vista da Ética e sendo esta a ciência que problematiza a moral, Responsabilidade Social remete ao que é costume – hábitos ligados às manifestações de cada comunidade através de suas tradições, vivências e crenças e de como estas acontecem no cotidiano. Assim, cada sociedade desenvolve seus valores e princípios suscetíveis à qualificação, considerando o adequado e moralmente corretos, dando-se importância a uma ligação direta entre discurso - a teoria - e ação - a prática -.


Cabe, então, à Responsabilidade Social se assentar sobre os conceitos da Ética, através de uma prática moral condizente com os direitos humanos mais elevados, da promoção da inclusão social ampla – a condição de cidadania – trabalhando para eliminar a discriminação seja ela cultural, racial e/ou ideológica e para tanto, não poderá se restringir ao assistencialismo. À Responsabilidade Social também deve caber à promoção do desenvolvimento sustentável incluindo em suas práticas a visão tripolar do mundo, levando em consideração na sociedade, a economia e o meio-ambiente.


Isso posto, a Responsabilidade Social pode ser definida como a íntima convicção social que determina norma ou conjunto de obrigações, ainda que não reconhecidas como matéria de Direito Formal, mas que pertencem ao campo da ética dos princípios ideais da conduta humana. É o processo resultante do desenvolvimento de posturas éticas inerentes aos estágios de evolução de determinados grupos/instituições/organismos sociais.


Na verdade, é no exercício da cidadania que se dá sua melhor definição. À medida que exercemos a Responsabilidade Social em seus mais variados níveis, seja como cidadãos comuns, empresas, comunidades, instituições governamentais e outras, é que podemos nos permitir compreender, com mais propriedade, as diversas questões que hoje são formadoras de exclusão (e o que fazemos individual e coletivamente para perpetuar esses esquemas) e ajuda-nos a intervir, de forma positiva e mais consciente, criando redes inclusivas.


A Psicossociologia já afirma que para se mudar algo no social é necessário mudar o seu significado, suas representações e logo, seu simbolismo no sentido coletivo. O Exercício da Responsabilidade Social pode ser uma importante ferramenta nesse sentido, trazendo idéias inovadoras, dando diferentes sentidos e arranjos a coisas antigas, pode construir o novo. Em ações coletivas inovadoras – inclusivas – construímos a capacidade de exercer a cidadania tanto a nossa como a do “outro” e com ela, todas as responsabilidades que lhe são inerentes, inclusive a social.
*Mestre em psicossociologia e consultora de empresas

Referências:

DALLARI, D. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo, Moderna, 1998.
GRAJEW, Oded. O que é responsabilidade social. Mercado global. São Paulo, Ano 27 nº 07, junho de 2000.
MAGALHÃES, N. O. B. Catálogo de Serviços do Terceiro Setor – A inserção do Design de Moda no âmbito da Responsabilidade Social. (Monografia de Bacharelado) – Design de Moda – Faculdade SENAI/CETIQT, Rio de Janeiro, 2007.

Cultura

Resultado da nossa enquete: a diversidade cultural do país tem alcançado mais visibilidade no governo Lula?

  • Sim. As iniciativas governamentais têm favorecido manifestações das diversas culturas. 46%
  • Não. O governo tem reforçado as mesmas restritas expressões de cultura predominantes no país. 54%

Nossa opinião

A potencialização da diversidade cultural de um país não necessariamente tem ligação direta com uma maior visibilidade de expressões variadas da cultura, e, sobretudo, das artes. Até porque visibilidade, em alguns casos remete mais à massificação que à participação ampla.

A percepção predominante – nesta enquete – de que o atual governo não tem favorecido à diversidade, carece, é claro, de rigor empírico para figurar como afirmativa-reflexo de uma situação experimentada e comprovada, porém, uma lista considerável de exemplos que ratifiquem tal afirmativa poderia ser apresentada, o mais atual e polêmico é a concentração dos recursos oriundos de renúncia fiscal do governo – leis de incentivo à cultura – na região sudeste.

Uma discussão que se prolonga há anos e que o atual governo não foi capaz de avançar. De um lado, produtores populares de cultura que não acessam tais recursos (pelos mais variados motivos, que poderemos elencar oportunamente), de outro, um governo, que ainda não conseguiu elaborar uma resposta à essa demanda urgente pela possibilidade de que uma miríade de expressões legítimas de nossas culturas ganhem maior visibilidade.

Gestão

Clonagem arriscada*

Thomaz Wood Jr

Analisada a superfície, o campo da Administração de Empresas é um grande sucesso. Nos Estados Unidos, pátria mãe do management, os indicadores são invejáveis. Em 1975, existiam 35.758 programas de MBA. Em 2000, o número havia subido para 112.258. A demanda por conhecimento na área fez florescer um ramo da indústria editorial, com livros e revistas especializados. A Harvard Business Review, título mais popular do gênero, tem uma circulação estimada de 500 mil exemplares, sendo 50% fora dos EUA. Com a globalização, proliferaram também as empresas de consultoria e os programas de educação executiva, um filão lucrativo para as escolas de negócios. Em paralelo, surgiu uma vigorosa comunidade acadêmica, voltada para o desenvolvimento do conhecimento no campo. A Academy of Management, principal organização, conta hoje com quase 18 mil membros e suas revistas científicas estão entre as mais citadas no meio.

Nas últimas décadas, o modelo norte-americano ganhou o mundo. A sigla MBA passou a ser vendida como passaporte para o sucesso profissional nas mais diversas latitudes. Os livros de pop-management e os gurus da gestão cruzaram oceanos, encontraram platéias dóceis e fascinadas e produziram clones locais. Até mesmo o modelo de organização científica foi exportado. Existe hoje uma European Academy of Management, uma Asian Academy of Management e até uma Ibero-american Academy of Management.


Curiosamente, não há encontro científico sério que não discuta a crise no campo. Primeiro, veio o ilustríssimo Henry Mintzberg, a desancar o modelo MBA, acusando-o de formar atores perigosos, capazes de causar grandes prejuízos às empresas. Depois vieram Jeffrey Pfeffer e Christina T. Fong, a sugerir que os programas de MBA significavam mais uma interrupção do que um impulso na carreira. Seguiram-se críticas à comunidade científica e sua forte tendência a se tornar uma torre de marfim, autocentrada, incapaz de produzir pesquisa relevante para a prática, e ignorada pelos executivos.


Em um ensaio publicado recentemente no Academy of Management Journal, Rita G. McGrath, da Columbia University, admite e disseca a crise. Segundo a pesquisadora, o sistema criou e institucionalizou práticas que se tornaram anacrônicas. A crise é confirmada pelo aumento das críticas, pela perda de prestígio dos programas de MBA e pela crescente percepção de que a pesquisa no campo tende a ser inútil para a prática gerencial.


Pindorama, entre outras nações, também mimetizou o modelo em crise, com adaptações e distorções. Nos anos 1990, por aqui explodiu o número de programas de Administração de Empresas. A qualidade, como esperado, não acompanhou a quantidade. Nas escolas-hotel, preocupadas em extrair a máxima ocupação de suas salas de aula, os professores são contratados em regime precário e induzidos a longas jornadas, em troca de pequenos salários. Sorte similar tiveram os programas de MBA. A sigla foi tão usada e abusada que perdeu o sentido original. Transformou-se em um contrato de compra de diploma a prestação: uns fingem que aprendem, outros fingem que ensinam, algumas moedas trocam de mãos e a vida segue seu curso.


Enquanto isso, a academia local, como outras, tenta simular os vizinhos do Norte. A cada ano, são gerados milhares de artigos de duvidoso rigor e improvável utilidade. Aqui, como lá, críticos há, geralmente entre os mais experientes. Aqui, como lá, também não faltam bons propósitos e inovações. Aqui, como lá, entretanto, mantém o sistema uma anacrônica malha de práticas e processos, alimentada pelo baixo clero burocrático e por outras tantas almas, amantes do status quo. De seu lado, nem sempre atendidas pelas instituições de ensino, as empresas ensaiam, com resultados heterogêneos, soluções para suas demandas de treinamento e desenvolvimento: criam universidades corporativas e contratam pequenas empresas e profissionais autônomos.


Qual o futuro das escolas de negócios? McGrath e colegas sugerem medidas práticas para mudar o quadro, tais como atrair para as escolas professores de tempo parcial, com experiência executiva, incentivar a pesquisa aplicada, desenvolver programas mais curtos e afinados com as demandas dos estudantes e das empresas e aproximar a pesquisa do ensino. Lá, como cá, motivos para mudar não faltam. Porém, os daqui são mais prementes. Pindorama permanece um rincão mal gerido, suas organizações de todos os naipes a desperdiçar recursos e perder oportunidades. Os primeiros 50 anos da Administração de Empresas no País não estiveram à altura das necessidades. Talvez os próximos possam ser um pouco melhores.

*Extraído de Carta Capital. Para acesso ao artigo na revista clique em Thomaz Wood Jr

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Sindicato

Desmobilização dos trabalhadores – Outras considerações

Sérgio de Souza Brasil*

Parece-me coerente o que foi abordado por Hiran Roedel, em recente artigo publicado neste blog, mas julgo que o capitalismo contemporâneo produziu essencialmente uma cultura da despolitização que se expressa não somente pela quebra das relações de solidariedade, mas, também, pela perda da consciência de que ela existe. A lógica da despolitização vem carregando dois valores muito perigosos:

(1) a relativização absoluta - com isso, tudo é possível e nada é nada, vale dizer, não há mais referencial estruturante (este é um dos motivos da idéia de pós-modernidade ter sido abraçada avidamente pela intelectualidade burguesa). Tal percepção leva o indivíduo a perceber que tudo deriva dele e a ele pertence, gerando o que chamo de individualismo-obssessivo. Qual a característica deste individualismo? Primeiro - achar-se absolutamente livre e, por conseqüência, absolutamente independente. Isto implica uma moralidade que se manifesta no pensar de que quem faz a moralidade sou eu. Segundo: a sensação de que agora o livre arbítrio como fonte da liberdade absoluta mais uma vez depende dos critérios estabelecidos pelo sujeito isoladamente.

(2) a ideologia (enquanto leitura de mundo hegemônica) de que eu me basto e que o outro é sempre meu concorrente. Isto implica que eu fortifique o meu sistema de aparências e que torne este sistema a minha teleologia. Ou seja: na essência disponibiliza-se um mundo tensional em que cada um é um ser isolado, operando sozinho e vivendo a lógica dos espetáculos. É uma marketização do comportamento (comportamentos-espetáculos, ou, cada sujeito é o seu próprio artista) o que ratifica e prioriza os sujeitos como seres disponíveis para a mercantilização. No fundo é uma mercadocracia e uma mercadolatria destinada e gerida pelo sujeito (e aí Marx continua a ser magistral na análise dos processos de produção das aparências, ou dos mecanismos de reificação).

Esta individualidade hipertrofiada fortalece o conceito burguês de que as coisas dependem exclusivamente do comportamento de cada um. O mais interessante é que este "isolacionismo" comportamental não gera angústia (como teria previsto o próprio Freud), porém euforia, fortalecendo a "velha" ideologia moderna de que o homem é o único senhor de si mesmo. A partir deste jogo referencial torna-se difícil mobilizar os sujeitos para o retorno à solidariedade. Os "laços" ao outro são tênues e substituídos pelos conceitos de "amigo" e "inimigo”, gostar ou não gostar (ou seja: se é meu amigo está de acordo comigo, caso contrário é meu inimigo, mas não o meu oposto. É um outro que tem outra posição diferente e pronto. Assim eu gosto ou não gosto. É simples gerenciar esta dicotomia!) e as possíveis associações são temporais. Não são mais sujeitos de classe, mas sujeitos de massa (no sentido mais adorniano da palavra) em que se associam somente em circunstâncias onde o objetivo se torna temporariamente comum.

Como pensar a consciência de classe? Fica extremamente difícil porque o processo de alienação - estranhamento de mim mesmo - é substituído pela consciência de mim mesmo como ser plenamente livre. Vale dizer: enfim a liberdade natural é alcançada!!! Os códigos sociais passam a ser apropriados em função da lógica da individualidade e a ética é expressão de cada indivíduo e não mais uma busca comum. Os sindicatos então são percebidos como "seres politizadores" o que entra em choque com a liberdade absoluta.

Desta forma me aproprio do sindicato pelo seu lado assistencialista, pois só pelo assistencialismo a minha liberdade absoluta é preservada. Por quê? Porque uso se desejar. A teorização disto tudo precisa ser destrinchada, porque há muita coisa para se pensar. Por isso tenho lhe dito que o marxismo contemporâneo precisa repensar algumas categorias que estão na própria construção discursiva da filosofia e da psicologia. Estes "atos" políticos e politizadores da esquerda são percebidos como algo de panelinhas, sem interesse para o individualismo-obssessivo.

*Ex professor da UFRJ e professor da Universidade Castelo Branco