quinta-feira, 21 de abril de 2011

Capital social

A Reprodução da Distinção – parte I

Simone Amorim*

Duas recentes reportagens do Jornal Valor Econômico** trataram da relação formação superior versus expectativa de ascensão social no Brasil, descrevendo as configurações dessa relação na atualidade, principalmente entre jovens de baixa renda, urbanos e de grandes metrópoles.

A primeira matéria destaca como a questão da origem familiar e das redes sociais dos indivíduos compõem aquilo que o sociólogo Pierre Bourdieu tão bem sistematizou em sua descrição acerca do capital social e de sua reprodução. A outra demonstra um panorama das expectativas que jovens de baixa renda depositam na formação superior como condição crítica de melhoria da qualidade de vida e descrevendo sob que circunstâncias esses mesmos jovens têm superado as dificuldades materiais de concluírem o ensino superior.

Tem-se muitos aspectos a serem discutidos a partir desses dois artigos, aos quais voltaremos com algumas outras reflexões nas próximas semanas, de forma que neste artigo proponho discutir um primeiro tópico que é a questão das redes sociais e do capital acumulado na medida em que é bem-sucedida a diversidade de conexões estabelecidas.

Cabe esclarecer: redes sociais são as redes estabelecidas entre os indivíduos, isto é, espaços em que os sujeitos se relacionam no mundo social, toda e qualquer interação entre as pessoas (as redes estabelecidas atualmente no ambiente virtual são apenas parte dessas interações e não o seu sinônimo). Um outro conceito explorado é a noção de capital social, que toma emprestado referenciais da economia para o campo do simbólico, trata-se da ideia de capital mesmo, como ‘moeda’ de valor, só que em outros campos. Segundo a formulação de Bourdieu, as trocas simbólicas se dão em diversos campos (social, cultural, econômico etc.) e em cada campo um tipo de capital específico tem maior relevância em relação a outro.

Pois bem, esclarecidos esses termos, voltamos ao nosso ponto que é a importância das redes como dinamizadoras do capital social. O que o jornal destaca na matéria ‘Honra ao mérito?’ é que “desde 1973 o retorno que a educação traz como investimento caiu. Em 1973, um profissional com diploma universitário tinha 2,21 vezes mais chances de ocupar um cargo de chefia do que um profissional com diploma secundário. Em 2008, esse número diminuiu para 1,1 vez mais chance. No que diz respeito ao impacto da origem de classe no destino, há uma redução de 3,03 em 1973 para 2,71 até 1988, ano a partir do qual o percentual se mantém constante”. Isto é, há mais de vinte anos que a escola apenas reproduz um sistema que mantém os mais altos níveis de desigualdade social jamais experimentados no país.

A pesquisa destaca ainda que “quanto mais local e menos diversificada, ou seja, mais concentrada na família, na vizinhança e em poucos amigos próximos, menor o acesso à oportunidades essa rede pode proporcionar. É o que ele chama de redes homofílicas. ‘As redes das pessoas pobres são compostas de pessoas muito parecidas com o próprio indivíduo’, observa Marques. ‘E quanto mais diversificada é uma rede, maior o acesso a oportunidades. Em vários casos, a pesquisa apontou que uma rede de relações mais diferenciada foi mais importante que o grau de escolaridade na obtenção de um emprego. Redes de relações são um baixo capital social em famílias mais pobres, fazendo que a origem dificulte o acesso a oportunidades mesmo daqueles que estudaram. ‘Mesmo quando a escola é boa, a família na qual a pessoa cresceu é importante’, afirma Ribeiro”.

Esses dois aspectos mencionados são sintomáticos, por conseguinte da mensagem final que gostaríamos de destacar: enquanto a escola se restringir a reproduzir a cultura dominante, esses jovens jamais serão capazes de protagonizar novas carreiras de vida, fundadas em seus interesses particulares, fruto de uma gama infinita de aportes coletados ao longo de todas as suas trajetórias e recombinados naquilo que bem entenderem. Vão ser submetidos a algo que nunca se tratou de Educação e que mesmo assim eles perseguem como se símbolo fosse de distinção social.

*Mestre em Bens Culturais e Projetos Sociais
**Caderno Eu & Fim de semana dos dias 18-03 e 15-04, respectivamente “Honra ao mérito?” e “Nos Caminhos do diploma”.

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei! Quero conhecer a segunda parte...