quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Gestão e sustentabilidade

O VI ENCAD e a Sustentabilidade II

Daniel Roedel

De acordo com o relatório Perspectivas Econômicas Mundiais, do FMI, o PIB mundial deve alcançar uma expansão de cerca de 4,5%*. Já o relatório Tendências mundiais do emprego - 2011, da Organização Internacional do Trabalho - OIT, aponta que mais de 205 milhões de pessoas em todo o mundo continuam sem ocupação laboral. Ou seja, mesmo que, por mais que modestamente o PIB mundial esteja crescendo... o desemprego também! E do mesmo modo o aquecimento global, conforme destaca o relatório Vital Climate Change Graphics for Latin America and the Caribbean, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente - Pnuma.

Os desastres ambientais decorrentes de atividades empresariais e o trabalho análogo à escravidão são evidências de que o modo predominante de gestão competitiva é no mínimo questionável, no que diz respeito ao atual quadro de crise socioambiental. Essas evidências têm sido apontadas pelos movimentos sociais e por setores da mídia.

Além disso, o acirramento da crise decorrente da financeirização da economia mundial vem mobilizando populações em diversas partes do mundo, com diferentes motivos e interpretações. Recentemente, em entrevista publicada pelo jornal O Globo, o sociólogo polonês Zigmunt Bauman declarou que as manifestações populares que ocorreram em Londres eram mais "um motim de consumidores excluídos".

Caso procedente, esse movimento o diferencia, por exemplo, da articulação de indignados que ocorre na Espanha contra a intensificação da sociedade pautada pelo mercado e se coaduna com o que Leonardo Boff, expressou em artigo no Portal Carta Maior (e divulgado neste Blog), de que “...as sociedades, a globalização, o processo produtivo, o sistema econômico-financeiro, os sonhos predominantes e o objeto explícito do desejo das grandes maiorias é: consumir e consumir sem limites. Criou-se uma cultura do consumismo propalada por toda a mídia”.

A esse respeito, é oportuno também destacar que no ano passado, enquanto trabalhadores chineses eram levados ao suicídio devido às precárias condições de trabalho proporcionadas por uma empresa produtora de componentes eletrônicos, consumidores em diversas partes do mundo faziam filas para comprar os produtos eletrônicos produzidos com a participação dessa empresa.

Tais constatações evidenciam que o modo de gestão empresarial dominante está inserido nessa lógica de produção e de consumo, na qual a intensificação da eficiência econômica é obtida a despeito da precarização das condições socioambientais.

Na obra As pessoas em primeiro lugar, publicada conjuntamente com o economista indiano Amartya Sen, o economista argentino Bernardo Kliksberg, analisando o quadro da crise de 2008, alerta que "a vinculação entre o rendimento dos gestores e a lucratividade das empresas fez com que se administrasse em alto risco de modo a favorecer os ganhos de curto prazo".

Já Sen, enfatiza na mesma obra que "...o capitalismo global está mais preocupado com a expansão das relações de mercado do que em garantir liberdades substantivas aos pobres no mundo". Esses entendimentos são corroborados por Thomaz Wood Jr que em artigo na revista Carta Capital** declarou que "a intensificação da competitividade em anos recentes tem colocado a gestão empresarial numa condição de risco, por se conduzir no limite fazendo com que qualquer erro possa gerar um desastre".

Não se pretende aqui responsabilizar a Administração de Empresas e os Administradores pelo atual estado de crise, uma vez que na primeira parte deste artigo tivemos a oportunidade de caracterizá-la como inerente à própria organização da sociedade para o mercado. Além disso, países de orientação dita socialista também adotaram práticas de organização e gestão da produção hostis ao equilíbrio socioambiental. O que se busca evidenciar é que a gestão empresarial não é neutra nem isenta! Ela se insere na ideologia dominante e a reproduz. E isso orienta, inclusive, a formação do Administrador tanto para empresas privadas quanto para empresas públicas e organizações da sociedade civil.

Aí surge um dilema: formar Administradores para esse mercado ou formar para a sociedade?

Assunto para o próximo artigo.
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*O percentual foi posteriormente ajustado para 4%.
**O título do artigo é 'Ícone em apuros'.

continua

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