quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Neoliberalismo e crise


Reflexões sobre a trajetória de hegemonização do capital financeiro no sistema do capital contemporâneo – parte II

Hiran Roedel*

Mercado globalizado e neoliberalismo

Nos anos 1990, especialmente com o desmonte geopolítico do bloco socialista que sucedeu ao fim da URSS em 1991, duas teses, que dialogam entre si, tornam-se hegemônicas nos campos econômico e político: a tese da globalização e a do neoliberalismo. A primeira oferece a explicação de que o mercado internacional, beneficiado pelas novas tecnologias que alteraram a relação tempo/espaço, modificou-se oferecendo maior rapidez de circulação do capital. Desse modo, o capital financeiro pôde estender seu domínio monetarizando o cotidiano no momento em que as multinacionais passaram a impor a lógica financeira às economias nacionais.

Ou seja, essas empresas, ao se utilizarem da poupança interna dos países onde se instalam, incorporam tais poupanças às suas lógicas financeiras. Com isso, quando as poupanças ganham o mercado globalizado sob a forma de expatriação dos lucros, de pagamento de serviços prestados, de inteligência comprada das multinacionais, podem posteriormente regressar aos países de origem como dívida ou crédito pelo qual devem ser pagos juros [1].

Nesse caso, a integração dos mercados de capitais se constitui em condição fundamental para a mobilidade do capital financeiro em nível internacional, pois possibilita a circulação mundial das poupanças internas e dos investimentos. Por isso, tal condição leva os Estados nacionais a perderem sua capacidade de regular ou determinar investimentos internos, dado que as taxas de juros passam a ser os determinantes desses investimentos [2].

A monetarização do cotidiano que se sucede leva à aparente afirmação do homo economicus de Adam Smith sustentado pela idéia de um mercado supostamente auto-regulado e que tem, na figura do rentista, a nova classe própria da globalização, a sua aparente confirmação empírica. Sua lógica agora impregna toda a vida social sustentada pelo discurso da eficiência da livre concorrência contraposta à incapacidade do Estado em gerenciar os recursos públicos. Emergia o discurso neoliberal como ferramenta para não só fundamentar uma lógica econômica, mas com a força enunciativa de uma nova realidade. Realidade esta assentada na “auto-gestão” do mercado, na tecnologia comunicacional e na falência simbólica e prática do Estado nacional.

O discurso neoliberal assume o protagonismo, a partir dos anos 1990, da representação da globalização como uma nova realidade que ao permitir a conexão em rede dos mercados, oferecia novas oportunidades de negócios às mais variadas localidades. A maior rapidez de circulação do capital, bem como a sua desterritorialização havia substituído, segundo os teóricos neoliberais, a dominação imperialista pela concepção de oportunidade de negócio. Afinal, o mercado deixara de ser organizado de modo hierarquizado para se postar em rede, horizontalizando-se.


*Diretor da Plurimus

Referências

[1] SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro: Record, 2000, pp. 43-44.
[2] HIRST, Paul e THOMPSON, Grahame. Globalização em questão. Petrópolis: Vozes, 1998, p.65.

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