quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Democracia

O poeta e o teste para a democracia*
Raphael Bruno**
" A democracia é a forma de governo em que o povo imagina estar no poder".
 A frase de Carlos Drummond de Andrade é até hoje usada como exemplo da irreverência e do ceticismo do poeta cujos 109 anos de nascimento seriam comemorados na sexta-feira passada. Mas é também de uma atualidade impressionante no momento em que, em várias partes do planeta, aspirações de democratização ganham força, mas encontram, em mecanismos de concentração do poder e da riqueza há muitas décadas consolidados, obstáculos para que a gestão de sociedades seja feita de maneira mais inclusiva, participativa, transparente e de acordo com as preferências dos cidadãos.

Após a chamada primavera árabe, em que as populações de diversos países da África e do Oriente Médio enfrentaram uma repressão sanguinária para remover do poder ditaduras brutais e excludentes, dois movimentos diferentes, mas interligados, chamam a atenção. Curiosamente, um ocorre no país que é considerado o berço da democracia clássica, a Grécia. O outro, naquele que, por muitos anos, foi apontado como o baluarte, o exemplo a ser seguido da democracia liberal contemporânea, os Estados Unidos.

Nas ruas de Nova York e em dezenas de outras cidades americanas, integrantes do "Ocupe Wall Street", movimento que protesta contra o sistema financeiro e pede mais justiça social, distribuição de riquezas e governos mais transparentes e acessíveis, são recebidos com gás lacrimogênio e balas de borracha por polícias locais.

Na Grécia, a decisão do primeiro-ministro George Papandreou de levar a referendo, um instrumento de democracia direta, o plano de corte de gastos exigido pela União Europeia para que o país receba ajuda para enfrentar a crise de sua dívida pública, foi recebida com revolta pelos líderes do continente e pessimismo pelas bolsas de valores, que despencaram imediatamente após o anúncio. Evidentemente, a vontade da população grega não combina com os desejos daqueles que controlam as finanças globais e as nações.

O atual modo de governo dito democrático está sendo testado. E, por enquanto, muitos diriam que Drummond estava certo.

* Extraído do jornal Destak
**Editor do jornal Destak de Brasília

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