quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Cidadania

Um outro mundo é possível

Hiran Roedel*

Chega ao final mais um encontro do Fórum Social Mundial (FSM). Criado em 2001, em Porto Alegre-RS, como contraponto ao Fórum Econômico Mundial (FEM), o FSM tem por princípio a luta de contra-hegemonia frente o predomínio do capital sobre a vida.


O FEM, criado em 1971 por Klaus Schwarb, por sua vez, tem seus eventos anuais realizados em Davos (Suíça). Como grupo de pressão, onde se reúnem os principais executivos do mundo dos governos dos países do capitalismo central, dá base ideológica e política ao modelo de desenvolvimento econômico de interesse dos grandes conglomerados empresariais.


Apesar de recentemente representantes dos países subdesenvolvidos (emergentes) também participarem desses encontros, a tônica é a da liberdade de atuação para o grande capital sediado no “porto seguro” das grandes potências. Daí partem as diretrizes para as políticas econômicas que devem ser implementadas por todos os países pobres, pois, caso contrário estes serão excluídos das “benesses” do desenvolvimento.


Mas que benesse? Afinal, o que se percebe é que a história do desenvolvimento econômico sob a égide do capital aumentou a exploração da força de trabalho, além de impor a parcelas cada vez mais amplas da população mundial a pobreza e a miséria. Realidade essa vivida, em especial, pelos habitantes do continente africano, boa parte do asiático e do americano.


Mas é necessário afirmar que isso não é resultado da falta de capacidade tecnológica de produção, mas sim de distribuição e, portanto, de decisões políticas. Ou seja, o modelo de Davos tem por lógica a submissão da vida aos interesses econômicos. Uma lógica que assumiu proporções descomunais sob a hegemonia da globalização que, a partir dos anos 90, ao impor o “pensamento único” como forma absoluta, unifocal, de leitura da realidade, subordinou a população mundial à livre circulação de capital.


Em resposta a tal cenário, em 2001 ocorreu o primeiro FSM. O eixo era fazer um contraponto ao modelo de Davos, cujo discurso ditatorial e midiático do “pensamento único” havia construído o consenso mundial em torno dos interesses corporativos dos grandes grupos econômicos.


O FSM surge, portanto, como contra-hegemonia à globalização. Sob tal perspectiva, as temáticas que nortearam todos os seus encontros foram marcadas pela crítica ao processo predatório sócio-natural promovido pelo domínio do capital. Desse modo, a produção e acesso às riquezas, o desenvolvimento sustentável e a reprodução social, o poder político e a ética, além da afirmação da sociedade civil e dos espaços públicos constituíram o eixo dos debates do Fórum. Um outro olhar com viés plural orientava essa nova experiência política que buscava romper os limites impostos pelo “pensamento único” de Davos.


A cidade de Porto Alegre foi a anfitriã dos três primeiros encontros. Assim, como propositora de uma alternativa ao cenário hegemonizado pelo capitalismo neoliberal, o FSM se assumiu como forma de globalização sociocultural e passou a ocorrer, também, em Mubai-Índia (2004), Bamako–Mali/Caracas–Venezuela (2006) e Nairóbi-Quênia (2007). Em 2009 foi a vez de Belém-PA, retornando ao Brasil.


O resultado positivo de todos esses encontros foi evidenciar, cada vez com mais clareza, a desfaçatez do discurso da globalização que, em momento de crise, mostra suas garras e submete o desenvolvimento sustentável a uma simples questão de retórica. Afinal, para atender às demandas do mercado (capital) as leis que regulam a exploração das riquezas naturais e que impactam diretamente sobre a vida, tornam-se, ao contrário do que apregoam seus defensores, mais flexíveis.


O Fórum Social Mundial, desse modo, não pode ser visto como espaço de formulação de políticas e nem com a obrigatoriedade de elaboração de documentos. Ele é mais do que isso. Como sociedade civil, ele cumpre o papel de campo plural de pressão sobre a sociedade política expressando, na prática, a pluralidade que lhe é essencial para fazer valer um novo sentido de democracia: plural e direta. Caso contrário, um outro mundo não será possível!


*Diretor da Plurimus

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei das idéias! Concordo plenamente com Dr.Hiran! Abraço, Simone Amorim